2 de abril de 2013

The Cabin in the Woods, ou a desconstrução do terror pela ficção científica de terror

É-me especialmente difícil escrever sobre The Cabin in the Woods, o filme realizado por Drew Goddard e realizado por Goddard e Joss Whedon que se tornou num dos grandes êxitos da crítica em 2012. Isto por dois motivos. O primeiro: enquanto género cinematográfico (e mesmo literário), o Horror sempre me pareceu pouco atractivo, e poucos foram os filmes que me conseguiram cativar - as mais visíveis excepções serão The Shining (que, enfim, é Kubrick), The Storm of the Century (na prática, mais um thriller sobrenatural com alguns sustos do que um filme de terror). O segundo: o intrincado enredo construído por Goddard e Whedon torna difícil falar das suas forças sem referir spoilers que o enfraquecem. No entanto, talvez estes motivos me ajudem - não sem alguma ironia - a dar forma a algo que se assemelhe a uma crítica, ou a uma análise a The Cabin in the Woods.

Comecemos então pelo primeiro. Mais do que um filme de horror, The Cabin in the Woods é uma desconstrução do género, que utiliza as suas convenções e tropes mais conhecidas para construir uma sátira inteligente, onde nada é aquilo que aparenta aparentar. Isto torna-se evidente na sua premissa fundamental, que poderia descrever The Evil Dead e muitos outros filmes: cinco jovens vão passar um fim-de-semana à casa de campo do familiar de um deles, mas estão muito longe de imaginar o que os espera. E se o clássico  de terror de Sam Raimi é uma das mais evidentes referências ao género (desde logo pela premissa, pela cabana e por muitos outros elementos e easter eggs), ela está longe de ser a única: ao longo dos seus 95 minutos de duração, The Cabin in the Woods homenageia, parodia e alude a inúmeros filmes que fazem parte da história do horror cinematográfico, conjugando as inevitáveis referências aos clássicos do género com outras de carácter mais obscuro. Para os cinéfilos apaixonados pelo horror, o exercício será porventura fascinante.


Já o enredo - para entrar no segundo ponto - é Whedon clássico, temperando a aparente seriedade da premissa com humor e com as suas inevitáveis one-liners, uma das imagens de marca de algumas das suas criações (como Firefly ou The Avengers). Aquilo que mais impressiona no argumento de The Cabin in the Woods, porém, é a inteligência da sua escrita à medida que desenvolve a narrativa como um puzzle, jogando com as expectativas do público para lhe retirar constantemente o tapete. Sabemos desde os primeiros minutos que há algo de errado na ideia apresentada: de um lado, temos os típicos adolescentes, que pequenas sugestões indicam não ser tão típicos quanto isso, a preparar o seu fim-de-semana na floresta; do outro, temos um estranho ambiente de escritório, quase deslocado e sem dúvida descontextualizado, numa narrativa secundária cujo cruzamento com a principal parece ao início improvável (para dizer o mínimo). E diria que isto é tudo aquilo que se pode dizer do filme sem estragar a experiência: se o fim-de-semana daqueles jovens será tudo menos aquilo que eles espera, também The Cabin in the Woods será tudo menos o filme de terror que o público esperará.


Isto porque na sua essência, The Cabin in the Woods é mais do que uma sátira ou do que um filme de terror com elementos de ficção científica. É uma comédia tão negra como inteligente, que parodia de forma elegante os vários elementos que a constituem para gerar tanto sustos como gargalhadas, num misto de homenagem com reflexão sobre o próprio género. Mas o humor que atravessa toda a narrativa não poderia estar mais distante do slapstick que habitualmente acompanha o cruzamento do horror com a comédia; mais subtil, ele surge na reflexão que os vários elementos proporcionam sobre a sua natureza, sobre a forma como o suspense é construído, e pela forma como o absurdo é montado e desmontado de forma quase simultânea. Por si só, estes elementos já formariam um excelente filme. Junte-se a tudo isto um elenco sólido e a atenção dada por Goddard e Whedon ao detalhe e às referências internas externas em todo aquele puzzle narrativo, e o resultado é um filme a todos os níveis excepcional. 8.4/10


The Cabin in the Woods (2012)
Realização de Drew Goddard
Argumento de Drew Goddard e Joss Whedon
Com Kristen Connoly, Chris Hemsworth, Anna Hutchison, Fran Kranz, Jesse Williams, Richard Jenkins e Bradley Whitford
95 minutos

4 comentários:

Loot disse...

Tb gostei muito, uma bela homenageme sátira ao género. O argumento é original e diferente e distinguiu-se.

Eu gosto do género terror muito. Ia sugerir terror + sci-fi e depois lembrei-me que já falaste aqui do the thing. Suponho que os alien tb. Adoro estes dois.

SPOILERS
SPOILERS
SPOILERS

e temos um unicórnio a matar alguém. Lindo!

João Campos disse...

Sim, já falei de "The Thing" e de "Alien" - e também gosto muito de ambos. O "The Cabin in the Woods" foi uma surpresa porque, como disse, não sou adepto do terror - digamos que no género gosto muito de "The Evil Dead 2" + "Army of Darkness", "The Shining" e da mini-série televisiva "The Storm of the Century".

SPOILERS
SPOILERS
SPOILERS

Também gostei muito do unicórnio, mas o que me fez rebolar a rir foi o tritão. :)

Mag disse...

O engraçado foi termos ganho as apostas :)

João Campos disse...

Yep. Ainda que as nossas apostas tenham sido diferentes: nós apostámos em quem sobreviveria (e se quisermos ser literais, ambos perdemos); no filme, apostava-se sobre que mostro iria aparecer. :)