20 de abril de 2013

Defiance: Uma estreia imperfeita, mas promissora

Defiance começa com o duo de protagonistas, Nolan e Irisa, a encontrar uma arkfall e a recuperar, com a ajuda de um pequeno cristal luminoso, uma esfera de energia muito valiosa designada por "Terra Core". Quem jogou o jogo - ou quem, como eu, dedicou algumas dezenas de horas à fase de testes - não só saberá logo em que consiste uma arkfall (fácil de deduzir pela série), como também será provável que identifique o cristal como o objecto recuperado numa missão com Nolan e Irisa, e roubado de forma algo irónica por estes. Para além das breves referências à E-Rep e aos 99ers, fica assim explicado como as duas narrativas em dois meios tão distintos se cruzam, pelo menos para já - e resta saber se em missões mais avançadas do jogo outras personagens da série irão aparecer, ou se personagens (NPC) do jogo poderão dar um ar de sua graça na televisão. Jon Cooper seria uma boa aposta.

Easter eggs à parte, Defiance arrancou na passada Segunda-feira nos Estados Unidos - um science fiction western que representa a nova grande aposta do SyFy Channel. Sim, é fácil encontrar naqueles 90 minutos as várias convenções (clichés, se preferirem) tanto dos velhos filmes do Oeste selvagem como de alguma ficção científica pós-apocalíptica - que podem ser consultadas no melhor (e mais divertido) local para o efeito, o TV Tropes. Adiante: A novidade que a série introduz não reside tanto nos seus elementos individuais, mas no mundo criado pela combinação (e possível subversão) de cada um desses elementos num quadro mais vasto. Nesse sentido, o episódio piloto cumpre o seu papel com distinção - estabeleceu de forma muito interessante a premissa sem revelar todos os mistérios e todos os truques que pode ter na manga; mostrou um mundo novo e rico; introduziu aquele que será porventura o arco narrativo principal da temporada, assim como vários enredos laterais; e apresentou as personagens que irão dar vida e cor àquele mundo*. 


E se as personagens parecem à partida convencionais, há em praticamente todas elas um pormenor, por pequeno que seja, que subverte um pouco a trope. Nolan (Grant Bowler) pertence à longa linha de renegados onde também figuram Han Solo e Malcolm Reynolds: Um anti-herói altruista. Com duas diferenças: Aceita um cargo de destaque e tem uma filha a seu cargo, Irisa (Stephanie Leonidas). A ligação entre o veterano e a jovem e irascível Irathient revela-se promissora desde os primeiros minutos, não só pela "química" entre ambos mas também por se saber desde logo que uma das histórias que um e outro contaram sobre o seu passado comum é falsa. Julie Benz representa o papel Amanda Rosewater, a recém-eleita Mayor de Defiance - a clássica cidade de fronteira -, e Mia Kirshner é Kenya, a prostituta que gere o Need/Want, na prática como o bordel da cidade; o twist em ambas reside no facto de serem irmãs (e no facto de o Need/Want ser tudo menos um bordel convencional). As famílias McCawley e Tarr são os Capuletos e os Montecchios da região, mas tudo indica que aquela história clássica não vai ser seguida à risca. E, numa preferência pessoal, Trenna Keating é Doc Yewll, a Indogene (muito) sarcástica que trabalha como médica em Defiance. Para um primeiro episódio mais preocupado em apresentar toda a gente do que em surpreender, os desempenhos foram mais do que competentes.


Do ponto de vista visual, Defiance oscilou entre efeitos especiais muito interessantes (a cena inicial) e outros mais fracos - mas que, mesmo assim, são um salto qualitativo face aos padrões habituais dos "SyFy Originals". As várias raças alienígenas são, na prática, humanóides - algo que é comum a muitas outras produções televisivas e cinematográficas (e mesmo de videojogos) de ficção científica. Ainda assim, as várias raças que o episódio piloto mostrou parecem suficientemente diferentes entre si para gerar alguma variedade (dentro do estilo "dois braços, duas pernas e uma cabeça, claro). 


Resta saber como irá o SyFy Channel desenvolver Defiance - e dado o historial do canal, a incerteza perdurará pelo menos até ao final da temporada. O potencial está lá, e ao que parece as audiências também: de acordo com a Entertainment Weekly, a estreia da passada Segunda-feira foi a melhor que uma produção do canal conheceu em muitos anos. Pode não ser uma nova Firefly ou uma nova Battlestar Galactica, e o seu piloto não terá certamente sido tão arrebatador como o daquelas; mas em por isso deixei de retirar destes primeiro episódio hora e meia de entretenimento mais do que satisfatório num ambiente com mais potencial do que a maior parte das produções de ficção científica tenho visto nos últimos tempos. Será, sem dúvida, uma série a seguir de perto.  


* E, já agora, mostrou os óculos escuros mais cool da ficção científica desde as lentes de Morpheus em The Matrix

4 comentários:

Bráulio disse...

Até agora, a tua análise é a mais positiva que vi por aí.

João Campos disse...

Não o diria. Tanto o io9 como o SF Signal fizeram análises muito positivas à estreia (sobretudo o último). A verdade é que é apenas o episódio piloto - com as suas qualidades e defeitos, é certo, mas será sem dúvida demasiado cedo para julgar a série no seu todo. Há ali muitas arestas por limar, sim, mas há também imenso potencial. Vamos ver o que faz o SyFy.

André Pereira disse...

lembras-me que devia ter escrito a minha análise.
Eu tive um sentimento misto, gostei e ouve aquele cringe moment.
Lá está, os clichés, mas a história parece ter pontas de originalidade - quero ver para onde vão com isto.

Saltando para o final, quanto apostas que a Syfy vai cancelar ou lixar? :C

João Campos disse...

Não faço apostas. Por um simples motivo: após anos de massacre na opinião pública, é possível que o canal queira dar a volta.

Talvez isto seja excesso de optimismo da minha parte - mas com apostas como Defiance, Helix, mais as mini-séries de The Man in the High Castle, Childhood's End e Ringworld... ambição não lhes falta, e ainda que isso não seja tudo, já é um bom princípio. Vamos ver se o canal aproveita a oportunidade ou se será definitivamente condenado à irrelevância.

Dito isto, acho incrível o SyFy Portugal colocar todas as fichas numa série de outra produtora (Game of Thrones) e não passar a produção da casa. Não quero dizer que não passasse GoT - é uma aposta ganha, afinal -, mas deixar o resto de fora é ridículo.