26 de dezembro de 2013

2013 em retrospectiva (1): Os melhores filmes

O final de Dezembro, como se sabe, presta-se aos balanços do ano que está prestes a terminar – e o Viagem a Andrómeda não será excepção a essa regra. A partir de hoje e até dia 31, será feito por aqui o balanço do que se leu, do que se viu, do que se acompanhou. Com a ressalva: estes artigos não incidirão sobre obras estreadas ou publicadas em 2013, mas sim sobre os livros, as bandas desenhadas, os jogos e o cinema que li, vi e joguei ao longo do ano, e dos quais fui aqui dando conta.

Comecemos então hoje com o cinema. A convite da Revista Bang!, escrevi um artigo para a edição online sobre os melhores e os piores filmes de ficção científica que estrearam no ainda corrente ano – esse artigo pode ser lido aqui. Sobre os outros filmes, aqueles que vi pela primeira vez neste ano, segue-se uma lista bem mais curta:

Realização de Stanley Kubrick
Argumento de Stanley Kubrick e Arthur C. Clarke
Com Keir Dullea, Gary Lockwood, William Sylvester e Douglas Rain
1968

Começar uma lista com uma excepção aos seus próprios critérios nunca é boa ideia, admito – mas julgo que neste caso tal opção é justificada. Antes de 2013 já 2001: A Space Odyssey era de longe o meu filme preferido, independentemente de quaisquer classificações de género; mas por iniciativa dos Cinemas UCI, tive oportunidade de neste ano rever o clássico de Stanley Kubrick como ele deve ser visto: no grande ecrã. E revê-lo assim demonstrou em definitivo por que 2001: A Space Odyssey continua a ser o derradeiro filme de ficção científica: nenhum outro, produzido antes ou depois, foi capaz de o igualar na ambição narrativa, na construção simbólica, no rigor científico, na montagem sonora e na perfeição visual. 2001: A Space Odyssey começa na madrugada da Humanidade, com os primatas proto-humanos, que por via de um objecto impossível – o célebre monólito – dão o salto evolutivo que os leva a descobrir a utilização de ferramentas, e de armas. O famoso match cut marca a transição para um 2001 futurista, quando a Humanidade já conquistou a órbita terrestre e a Lua, e faz uma descoberta que levará o astronauta Dave Bowman até às luas de Júpiter, e a um enigma com milhões de anos que o levará à transcendência. Na viagem, uma surpreendente reflexão sobre a vida surge por meio de HAL 9000, a inteligência artificial programada para não falhar que descobre a natureza da dúvida. Portentoso, evocativo e abstracto, 2001: A Space Odyssey é com toda a justiça um marco na história do cinema em geral, e da ficção científica em particular. 

Realizado por Hayao Miyazaki
Argumento de Hayao Miyazaki
Com Yuriko Ishida, Yuko Tanaka, Kaoru Kobayashi, Masahiko Nishimura, Akihiro Miwa, Mistuko Mori e Hisaya Morishige
1997

A propósito de Mononoke-hime, obra-prima do mestre da animação japonesa Hayao Miyazaki, já muito se disse e escreveu. Podemos elogiar a qualidade da animação, superlativa como em todos os seus filmes desde Nausicaä; podemos destacar as suas personagens, bem trabalhadas, bem desenvolvidas e, no final, inesquecíveis; ou podemos ainda sublinhar a forma como dá forma a uma mitologia fascinante e singular através da combinação de inúmeros elementos fantásticos. Em termos pessoais, porém, julgo que a grande força de Mononoke-hime não reside neste elementos, sem dúvida importantes, mas no seu argumento - que recupera o tema do bom selvagem e da corrupção da sociedade e da tecnologia para contar uma história nova, erradicando da sua premissa o maniqueísmo que lhe é tão típico. No conflito entre o mundo natural e o mundo tecnológico de Mononoke-hime, não há um lado necessariamente certo e outro necessariamente errado - há, sim, muita ambiguidade em ambas as facções, capazes em simultâneo das maiores atrocidades e dos actos mais nobres. E há a história de San, criada com os lobos da floresta, e de Ashitaka, o último príncipe do seu povo, que impõe o seu próprio exílio para proteger a sua aldeia. 

Metropolis
Realização de Fritz Lang
Argumento de Thea von Harbou
Com Brigitte Helm, Gustav Frölich, Alfred Abel e Rudolf Klein-Rogge
1927

Será talvez impossível olhar para Metropolis sem se deixar levar pela sua assombrosa estética – e sem deixar de notar quão à frente do seu tempo estava em 1927, ano da estreia deste clássico do cinema mudo. A verdade é que as miniaturas e as maquetas de Fritz Lang parecem ainda hoje mais reais do que muitos efeitos especiais computorizados do presente – e com elas, o cineasta alemão conta de forma magnífica a história de Freder, um indivíduo da classe privilegiada que, atraído pela belíssima Maria, decide explorar as fundações da sua cidade para ver como ela verdadeiramente funcionava; e lá, descobre um mundo infalível na sua pontualidade e na sua rigidez mecânica e desumanizante. A evocação de Moloch, a criação de Maria, decerto um dos primeiros andróides da ficção científica, os relógios – nenhum detalhe de Metropolis é deixado ao acaso, e todos eles são soberbos.

Realização de Fred M. Wilcox
Argumento de Cyril Hume, Irving Block e Allen Adler com base na peça The Tempest, de William Shakespeare
Com Leslie Nielsen, Walter Pidgeon, Anne Francis, Warren Stevens e Jack Kelly
1956

Pode um filme de ficção científica aparentemente pulpy ser um dos maiores clássicos do género? Pode, claro – e Fred M. Wilcox demonstrou-o ao transportar os motivos principais de The Tempest de Shakespeare para o cenário de ficção científica de Forbidden Planet. A tripulação da nave C57-D da United Planets é enviada para o planeta Altair IV, a 16 anos-luz de distância da Terra, em busca da expedição que lá se perdera vinte anos antes. Na superfície, porém, encontram apenas um sobrevivente, o linguista Edward Morbius, e a sua jovem filha, Altaira, já nascida no planeta. A ajudá-los está Robby the Robot, um dos mais icónicos robots da história do cinema – e por detrás da sua criação e dos estranhos fenómenos que têm lugar na superfície (e que causaram o desaparecimento da expedição original) encontra-se uma tecnologia impossível. Com uma premissa espantosa, uma mão-cheia de excelentes ideias e uma execução visual e sonora magnífica, Forbidden Planet é um marco no género, e um filme surpreendente pela forma como se consegue elevar acima de alguns elementos mais convencionais da ficção científica da sua época para contar uma história complexa e fascinante.

2 comentários:

Anónimo disse...

Tudo filmes que vi na minha infância e adolescência, quando a RTP 2 era uma boa escola de formação de cinéfilos. Foi o início da minha paixão pela fc e pelo fantástico. Não encontro muitas pessoas com as mesmas referências.

João Campos disse...

Por vezes penso que devia ter dado mais importância à RTP2 durante esses anos. Enfim, há um tempo para tudo.