13 de novembro de 2013

Theros: Os monstros, os heróis e os Deuses

Miau - erm, RAWR
Como já aqui referi várias vezes ao longo dos últimos meses, este ano marcou o meu regresso ao universo de Magic: the Gathering, após uma década quase sem jogar. Em 2013 participei em três torneios de pré-lançamento de novos blocos, no invariável formato limitado de sealed deck - a saber, Dragon's Maze, Core Set 2014 e, mais recentemente, Theros. Sobre o torneio deste último bloco, pouco há a dizer - foi divertidíssimo tanto pelos adversários enfrentados como pela constatação de que um pouco de sorte - que faltou nos anteriores - pode fazer milagres (no caso, a sorte traduziu-se em dois Fleecemane Lion, um Fabled Hero e um Nykthos - apoiados por uma quantidade generosa de boas comuns e incomuns em verde e branco). Isso e os topdecks, como um Agent of the Fates de um adversário me demonstrou em duas rondas seguidas. 

Mas adiante - se o torneio de pré-lançamento em si tem pouca história (apesar da diversão que proporcionou), já a expansão de Theros merece algum destaque pela sua excelente concepção, que deu origem a uma colecção de cartas variada, interessante, muito divertida de jogar - e imbatível em termos de referências (na gíria, de flavour). Não foi a primeira vez que a Wizards se foi inspirar numa mitologia específica ou num folclore concreto para dar coesão temática a uma colecção - por exemplo, fê-lo recentemente em Innistrad, indo beber às histórias populares do Leste Europeu, e fê-lo no bloco de Kamigawa, em 2004, com forte inspiração nas culturas e mitologias orientais. Mas Theros foi buscar as suas influências à mitologia grega, mais conhecida no Ocidente pelos seus mitos e pelos seus clássicos - e usou referências conhecidas para desenvolver as mecânicas e as cartas para dar à colecção um flavour único.

Podemos começar no exemplo acima, o Fleecemane Lion: inspirado no célebre - e temível - Leão de monstrosity a conferir a impenetrabilidade do seu couro, por força de armas ou habilidades mágicas (traduzidas em indestructible e hexproof). Os monstros, como se sabe, abundam na mitologia grega, e o R&D da Wizards fez os trabalhos de casa com afinco. Hythonia the Cruel a aludir às górgonas e em especial a Medusa; Polukranos, World Eater, recuperando as várias hidras das histórias antigas; Colossus of Akros a representar o célebre Colosso de Rhodes, uma das maravilhas do mundo antigo: três óptimos exemplos de cartas relevantes para vários formatos e bem construídas no enquadramento entre o tema da cor, o tema do bloco e as mecânicas exclusivas. A arte, regra geral excelente, é a cereja no topo do bolo.

A enfrentar os monstros mitológicos estavam, como se sabe, heróis - representados através da mecânica de heroism, que produz efeitos quando são reforçados por magia. Já referi acima o Agent of the Fates e o Fabled Hero - e poderia referir também Akroan Crusader, Anthousa, Sethessan Hero, Arena Athlete, Wingsteed Rider, Phalanx Hero. Entre muitos outros, note-se.

Mas onde Theros revela na perfeição o seu extraordinário flavour é em algumas cartas individuais cujo design top-down se revela excepcional. A imagem de Cérbero, o terrível cão de três cabeças que guarda a passagem para o reino dos mortos, é universalmente conhecida - e, nesta colecção, foi transposta para Underworld Cerberus, com as três habilidades da criatura a reflectir a sua condição de guardião do submundo. Chained to the Rocks é outro exemplo - a ilustração é alusiva ao mito de Prometeu agrilhoado, mas em teoria poderia referir-se também a Andrómeda. Titan's Strength vai buscar inspiração visual ao celebérrimo mito de Sísifo, a empurrar a pedra montanha acima. Curse of the Swine alude de forma brilhante a Circe e ao feitiço que lançou à tripulação de Ulisses. Mas a taça irá talvez para o Akroan Horse - o Cavalo de Tróia é uma referência cultural incontornável, e encontra-se desenhado na perfeição nesta carta. É dado ao adversário, e gera Soldados contra ele. 

A excelente concepção de Theros tem como expoente máximo os seus deuses - em termos narrativos, as cinco divindades, alinhadas com as diferentes cores da magia (e respectivos atributos), que observam e comandam os destinos dos habitantes do plano de Theros. Representados com uma nova combinação de tipos - são em simultâneo encantamentos e criaturas, têm o inevitável estatuto de lenda e são, para todos os efeitos, indestrutíveis; e, num toque muito curioso (que me leva mais para os domínios de Discworld ou The Sandman do que para os mitos clássicos), têm a sua manifestação física dependente da crença dos seus fiéis, representada pela nova habilidade de devotion. No branco temos Heliod, inspirado em Apolo: simboliza a lei, a ordem, a justiça e a honra. A sua arma é uma lança. Thassa, reminiscente de Poseidon, é a deusa do mar e das criaturas marinhas. Representa o azul, o conhecimento e a passagem do tempo, e tem como arma um bidente. Pelo preto temos Erebos, divindade associada ao submundo, inspirada em Hades - deus da morte e dos maus presságios, empunhando um temível chicote. No vermelho temos Purphoros, recriação de Hefaísto para Theros: deus do fogo, dos ferreiros, dos artesãos e das artes criativas em geral; a sua arma, como não poderia deixar de ser, um martelo. Por fim, temos Nylea, deusa das florestas, da caça, das estações do ano. Associada a Artemisa, tem como arma um arco. As próximas expansões deste bloco irão incluir mais deuses e semi-deuses; se a construção de cada um continuar a ser tão bem feita como destes cinco, em Abril do próximo ano os jogadores terão um fascinante panteão completo. 
Em termos narrativos, foi criado todo um plano inspirado nas cidades da Grécia antiga (de Esparta a Atenas), e povoado com as criaturas mitológicas inevitáveis: centauros, minotauros, sátiros, dríades, espíritos, gigantes, ciclopes, hidras, monstros marinhos gigantescos, esfinges e até mesmo um dragão. A história acompanha uma personagem já familiar: Elspeth Tirel, a planeswalker guerreira apresentada em Alara que, no seguimento da guerra no plano de Mirrodin (ou no que restou dele), escapou para Theros - um plano onde estivera muitos anos antes. A ideia era encontrar um sítio sem guerra ou conflito; mas, ao entrar naquele mundo, acaba por tropeçar nos planos dos deuses - sobretudo de Heliod. Mas também acompanha Xenagos, um sátiro natural de Theros que, ao tornar-se num planeswalker, descobriu, para seu espanto, a vastidão do Multiverso - e que o poder dos deuses do seu plano se encontra limitado.

Ilustração de Eric Deschamps
Resta ver como irão próximas expansões deste bloco, Born of the Gods e Journey Into Nyx, expandir os temas apresentados em Theros e explorar outras referências e outros motivos da vasta mitologia grega. E, claro, como serão expandidas as jornadas de Elspeth e Xanagos, e desenvolvidos os planos dos deuses. Até ao momento, sabe-se que serão criadas dez divindades menores, em todas as combinações de duas cores possíveis. O resto, permanece ainda envolvo em segredo. Em Feveveiro de 2014 teremos parte das respostas.

Fonte: Daily MTG

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