9 de abril de 2013

Dredd, ou a apologia da acção pura

Judge Dredd, uma das personagens mais icónicas da banda desenhada britânica, é presença constante nas páginas da revista de banda desenhada de ficção científica 2000 AD desde o seu segundo número, em 1977. E o seu estatuto no meio não se deve tanto ao futuro distópico e pós-apocalíptico imaginado por John Wagner e ilustrado por Carlos Ezquerra, mas ao seu peculiar sistema de justiça - num mundo onde o crime reina, o mandato de cada Juiz permite-lhe agir perante o crime como polícia, juiz, juri e carrasco - e recorrendo à violência sempre que considerar necessário. Como é evidente, uma premissa desta natureza pode suscitar inúmeras reflexões interessantes - mas também pode servir, muito simplesmente, como base para um filme de acção pura. A prova disso é Dredd (2012).

Realizado por Pete Travis e com argumento de Alex Garland, Dredd recria o universo ficcional de Wagner e Ezquerra numa "Mega-City-One" imensa e caótica, estendida entre Boston e Washington D.C., encerrada sobre as suas próprias muralhas e entregue à criminalidade violenta. Nesta vasta metrópole, apenas os Juízes fazem cumprir a lei - e fazem-no com mão de ferro. Dredd (Karl Urban) é um desses Juízes, implacável no cumprimento da lei - e é a ele que cabe fazer uma nova avaliação a Cassandra Anderson (Olivia Thirlby), uma aspirante a Juiz que não passou na recruta básica, mas a quem foi concedida uma segunda oportunidade devido ao seu dom telepático. Nesta avaliação, vão a um território especialmente hostil - um enorme edifício-favela de 200 andares como Peach Trees, no qual os Juízes raramente entram - investigar um triplo homicídio (um crime comum em "Mega-City-One"). Aquele crime, porém, acaba por revelar uma ligação muito próxima ao tráfico de uma nova droga designada por "Slo-Mo", que altera a percepção do tempo no cérebro de quem a toma - e quando a matriarca do crime em  Peach Trees, Madeline "Ma-Ma" Madrigal (Lena Headey) descobre que tem os Juízes no seu encalço, decide preparar-lhes uma armadilha...


O enredo de Dredd, assim resumido, recorre assim a duas convenções clássicas dos filmes policiais - a dupla de polícia experiente com novato e ao barão da droga como vilão - para sustentar toda a sua narrativa de acção. E neste campo fá-lo com mestria, mostrando os dois Juízes a avançar pela torre enquanto enfrentam com o seu arsenal futurista os capangas de Ma-Ma. Não há em Dredd espaço para a subtileza ou para quaisquer nuances narrativas: há, sim, muita pancadaria, muito sangue e imensas explosões, num autêntico festival de ficção científica violenta, imparável a partir do momento em que Dredd e Anderson se vêem encurralados em Peach Trees. O filme progride ao ritmo frenético dos disparos, com um enredo previsível mais preocupado em servir uma boa dose de adrenalina do que alguma complexidade narrativa. E a verdade é que funciona.


Na prática, Dredd é uma hora e meia de puro e bem sucedido entretenimento - um enredo bem ritmado e salpicado de um humor muito peculiar, óptimos efeitos especiais e, claro, um excelente pretexto para utilizar várias e belíssimas imagens em câmara lenta: a droga "Slo-Mo". Os desempenhos competentes dos actores principais ajudam: Karl Urban, cujo capacete lhe esconde o rosto durante todo o filme, é um excelente e incorruptível Dredd; Olivia Thirlby mostra uma Anderson credível no seu misto de determinação com insegurança; e Lena Headey está excelente (e muito bem caracterizada) no papel de Ma-Ma, que não olha a meios ou a danos colaterais para eliminar ambos os Juízes.


Dredd não é um filme extraordinário - no que à ficção científica cinematográfica de 2012 diz respeito, não tem a subtileza narrativa de Looper, a mensagem de Cloud Atlas ou mesmo a extravagância de The Avengers. Mas é um filme sólido, com um enredo simples e directo, bons efeitos especiais e desempenhos adequados - e nenhum destes elementos tenta, em momento algum, ofuscar a verdadeira natureza de Dredd: um filme de acção pura e dura. E nesse terreno, mas apenas nesse terreno, Dredd é um óptimo filme, fazendo esquecer o primeiro e sofrível filme inspirado no universo criado por John Wagner e Carlos Ezquerra. 7.2/10


Dredd (2012)
Realizado por Pete Travis
Argumento de Alex Garland com base nas personagens de John Wagner e Carlos Ezquerra
Com Karl Urban, Olivia Thirlby, Lena Headey e Wood Harris
95 minutos

2 comentários:

ATP disse...

Tenho aqui o filme. Este e o Total Recall - remake, a ver se lhes espreito este domingo.

João Campos disse...

Ainda não vi o Total Recall. Não ando com muita vontade, apesar de incluir a Kate Benckinsale. Mas este Dredd é muito interessante.