21 de fevereiro de 2013

Tolkien: Construtor de Mundos (2): Da simbologia do Anel às florestas da Terra Média

O seminário Tolkien: Construtor de Mundos, que decorreu no passado dia 19 na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, começou com duas sessões muito interessantes: a primeira, a cargo do professor Nuno Simões Rodrigues (do Centro de História da Universidade de Lisboa), incidiu sobre o tema do Anel, tanto no contexto da obra de Tolkien como na sua componente simbólica noutras histórias e em mitologias; a segunda, do professor José Varandas (também do Centro de História da Universidade de Lisboa), dedicada às florestas em Tolkien.

Com o mote de Um anel para todos dominar, Nuno Simões Rodrigues falou do anel enquanto mitema, elemento presente noutros universos mitológicos. Objecto mágico por natureza, portador de uma multiplicidade de significados, o anel encontra-se presente como motivo e símbolo em culturas díspares como a grega (o Anel de Polícrates, entre outros), a egípcia (envolvendo Hórus e Set), a judaica (o anel de Salomão), e mesmo nos contos de fadas (não será necessário voltar a referir Der Ring des Nibelungen). Outros elementos identificados em Tolkien podem também ser observados nas mitologias e no folclore dos povos celtas, escandinavos e germânicos, e em textos fundamentais da cultura ocidental - como a Epopeia de Gilgamesh, o Kalevala ou Beowulf, a título de exemplo. O mais relevante é que Tolkien, enquanto filólogo, teve acesso a muitas destas fontes e estudou vários textos nos idiomas originais, antigos - e tudo isso contribuiu para a sua própria criação mitológica.

A segunda sessão, a cargo do professor José Varandas, foi uma das melhores de todo o dia. Com o título Lothlorien (E Outras Florestas) abordou o tema das florestas em Tolkien partindo de uma definição daquele espaço tanto num plano pessoal como num plano científico - constituindo no primeiro caso um espaço de retiro e de observação, e no segundo um elemento natural e selvagem. Na obra de Tolkien, porém, a floresta surge sobretudo como elemento não natural e não selvagem - Lothlórien e Rivendell, como florestas élficas, não são caóticas mas organizadas, idealizadas, perfeitas. Lothlórien, por exemplo, é um espaço temido pelos Orcs, "onde o Mal não entra" (recorde-se a relutância em abrigar a Irmandade, com excepção de Legolas), e onde existem "elementos mágicos que dão à Irmandade maior capacidade de sobrevivência". Para todos os efeitos, as florestas de Lothlórien e de Rivendell "reprimem o caos" (elemento paradigmático nas sagas) e proporcionam à narrativa "momentos de respiração" e de "protecção" - e, algo relevante, que definem características distintivas entre os povos élficos. São espaços quase eternos, como um "último reduto do mundo antigo, que desaparecerá após a passagem do Anel". Tal como aconteceu a ambas as florestas - e, num dado curioso apontado pelo orador, como aconteceu às florestas naturais (selvagens) da Europa, consumidas pelo progresso de vários povos desde os Romanos e sobrevivendo apenas em nichos.

Mas em Tolkien, salienta José Varandas, as florestas também podem ser vistas "enquanto entidades próprias". É o caso de Fangorn, a floresta dos Ents, agressiva e perigosa - uma "floresta-entidade" que se forma na sua destruição pelos Orcs e retalia. Por sinal, não são os Homens quem derrota Saruman, mas sim os Ents e a própria Fangorn quem o faz, derrubando Isengard e destruindo os Uruk'hai - que, conforme sublinhou o professor, "caminham de dia e não temem a floresta", personificando a "maquinaria pesada", a indústria que Sauron representa, e que destrói o mundo natural. Já a Floresta Velha, onde está o Salgueiro (e onde vive Tom Bombadil), acaba por se aproximar mais de um "submundo de Ulisses", a uma descida ao mundo dos mortos (as "Barrows").

Imagem: The Forest of Lothlorien in Spring, por J.R.R. Tolkien; imagem encontrada na Tolkien Gateway.

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