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3 de setembro de 2014

Khans of Tarkir: Clãs, planeswalkers e dragões

Depois do anúncio sobre as mudanças profundas na estrutura das colecções (e do impacto em alguns formatos de jogo), Magic: the Gathering entrou oficialmente na temporada de spoilers da nova colecção, Khans of Tarkir - com lançamento marcado para o último fim-de-semana de Setembro. A PAX Seattle (convenção de videojogos organizada pela Penny Arcade) serviu de palco para vários anúncios, entre os quais se contam a reimpressão das fetchlands originais de Onslaught. Mas o mais interessante - pelo menos, na perspectiva habitual do Andrómeda - foi o painel sobre a narrativa e o worldbuilding em Khans of Tarkir, que contou com a presença do designer e escritor Doug Beyer. E que abriu com o trailer oficial:


Seguiu-se a apresentação mais pormenorizada dos cinco clãs de Tarkir, com a filosofia subjacente a cada uma das facções e com alguns dados muito interessantes sobre a trama particular deste novo bloco, e sobre o seu enquadramento na narrativa mais vasta de Magic. Já se sabe há algumas semanas que, na sua totalidade, a história do bloco completo de Khans (Khans, Fate Reforged e a terceira colecção, com o título ainda por anunciar) terá um tema de viagens no tempo - porventura uma regressão temporal para um momento que anteceda a morte do dragão-planeswalker Ugin (finalmente confirmada), que em tempos idos ajudou Sorin Markov e um outro planeswalker nunca nomeado a selar os horrores cósmicos conhecidos como Eldrazi numa tumba no mundo verdejante de Zendikar. O mote para a trama é dado por Sarkhan Vol, planeswalker introduzido em Shards of Alara (2008), que regressa ao seu plano-natal depois da desilusão do encontro com o Elder Dragon Nicol Bolas e dos acontecimentos em Zendikar que resultaram na libertação dos Eldrazi. Na sua peugada segue Sorin Markov, que procura algumas respostas sobre o destino de Ugin - e que as irá encontrar na paisagem devastada de Tarkir, um mundo devastado por uma guerra permanente onde os dragões foram extintos há muito tempo.

Resta saber em que moldes irá ter lugar a regressão temporal anunciada, e que impacto irá ter em algumas das várias tramas em curso no Multiverso de Magic - para tal teremos de aguardar até finais de Janeiro. Para já, tudo o que se sabe sobre esta nova colecção começa a agora a ser reunido no Planeswalker's Guide to Khans of Tarkir.

Fonte: Daily MTG

1 de setembro de 2014

Aconteceu em Setembro:

(Artigo em actualização)

01 de Setembro:
  • 1875 - Nasceu Edgar Rice Burroughs, o autor que criou alguns dos mais célebres heróis de aventuras, como Tarzan, da série de histórias homónima, e John Carter de Marte, o protagonista da saga Barsoom, situada num Marte lendário. Pellucidar e Venus& são dois dos outros universos ficcionais deste autor prolífico e influente, inúmeras vezes homenageado na ficção científica. Burroughs faleceu a 19 de Março de 1950.
  • 1942 - Nasceu C. J. Cherryh (Carolyn Janice Cherry), autora norte-americana de ficção científica que se notabilizou pelos romances premiados Downbelow Station (1982) e Cyteen (1989). Na sua bibliografia encontram-se várias séries literárias de duração variável, como The Company Wars (iniciada em 1982 com Downbelow Station e continuada com Merchanter's Luck, Rimrunners, Heavy Time, Hellburner, Tripoint e Finity's End, este último de 1997), The Era of Rapprochement (que inclui Serpent's Reach, Forty Thousand in Gehenna, The Scapegoat, Cyteen e Regenesis, publicados entre 1980 e 2009) e os romances de The Chanur (The Pride of Chanur, Chanur's Venture, The Kif Strike Back, Chanur's Homecoming ;e Chanur's Legacy, publicados entre 1981 e 2007), entre muitas outras.

02 de Setembro:
  • 1973 - Faleceu John Ronald Reuel Tolkien, aos 81 anos de idade. Académico, escritor, ensaísta e tradutor britânico nascido na África do Sul, Tolkien tornou-se num dos mais relevantes filólogos do seu tempo, assim como um estudioso do inglês antigo e das sagas escandinavas. Mas foi como escritor que conquistou uma aclamação de escala mundial ao publicar primeiro The Hobbit, em 1937, e já nos anos 50 a trilogia The Lord of the Rings, que se tornaria no texto mais importante da fantasia épica literária. O mundo secundário da Terra Média foi alargado para uma escala ímpar em The Silmarillion, o magnum opus publicado a título póstumo pelo seu filho Christopher; na sua bilbiografia incluem-se ainda The Children of Húrin, também na Terra Média, e textos como The Legend of Sigurd and Gudrún, The Fall of Arthur e uma tradução do clássico Beowulf só este ano tornada pública. Tolkien nasceu a 03 de Janeiro de 1892. 
  • 2013 - Faleceu Frederik Pohl, autor, editor, crítico e fã de ficção científica, e uma das suas vozes mais relevantes na segunda metade do século XX. Na sua bibliografia merecem destaque a distopia The Space Merchants (1953), escrita com Cyril M. Kornbluth, e Gateway, o romance de 1977 que se tornou num clássico incontornável do género, tendo conquistado os prémios Hugo, Nébula e Locus. Como editor, notabilizou-se ao leme das revistas Galaxy e If, entre 1959 e 1969. Manteve ao longo de toda a sua vida uma actividade intensa e ininterrupta no fandom: em 2010 venceu mesmo o prémio Hugo na categoria de "Best Fan Writer" pelo seu blogue, The Way the Future Blogs. Frederik George Pohl, Jr. nasceu a 26 de Novembro de 1919. 
06 de Setembro:
  • 1950 - Faleceu Olaf Stapledon, filósofo britânico e autor de clássicos influentes da ficção científica literária como Last and First Man (1930), Star Maker (1937) e Sirius (1944), entre outros. Stapledon nasceu a 10 de Maio de 1866
  • 1972 - Nasceu China Miéville, autor britânico de fantasia e de horror frequentemente associado ao movimento New Weird. Na sua bibliografia incluem-se romances como Perdido Street Station (2000), Iron Council (2004), The City & the City (2009), Embassytown (2011) e Railsea (2012), entre outros.
10 de Setembro:
  • 1953 - Nasceu Pat Cadigan, autora norte-americana de ficção científica que, juntamente com Bruce Sterling e William Gibson (e outros), foi uma das pioneiras do movimento cyberpunk que nos anos 80 deu todo um novo fôlego ao género tanto em termos temáticos e filosóficos como em termos estéticos. Participou na antologia Mirrorshades (1986) com o conto Rock On; e da sua bilbiografia fazem parte títulos como Mindplayers (1987), Synners (1991) Fools (1992) e Tea From an Empty Cup (1998), entre outras peças de ficção curta. 
12 de Setembro:
  • 1921 - Nasceu Stanislaw Lem, filósofo, satirista e autor polaco de ficção científica. O tema da impossibilidade de comunicação entre civilizações humanas e alienígenas surge destacado na sua obra, em romances como The Man From Mars (o seu primeiro livro publicado, em 1946), Eden (1959), Fiasco  (1986) e, claro, Solaris, o clássico de 1961 que já conheceu três adaptações cinematográficas, das quais a mais conhecida (e aclamada) será a de Tarkovksi em 1972. Na sua bilbiografia merece ainda destaque The Futurological Congress, de 1971. Stanislaw Lem faleceu a 27 de Março de 2006.  
  • 1997 - Faleceu Judith Merril (Judith Josephine Grossman), autora e editora norte-americana de ficção científica que se notabilizou pela sua ficção curta, pelo romance Shadow on the Hearth (1950) e pelo seu trabalho como antologista, no qual merece destaque a organização da série de antologias The Year's Best Science Fiction and Fantasy entre 1956 e 1966. Judith Merril nasceu a 21 de Janeiro de 1923.
(continua)

28 de agosto de 2014

This happening world (21)

Em meados de Agosto, surgiu na Wired uma discussão muito interessante em dois artigos antagónicos sobre uma das principais tendências da ficção científica contemporânea: a distopia. A discussão começou com o artigo de Michael Solana, que aponta: Obviously science fiction is not the cause of the current mess we’re in. But for their capacity to change the way people think and feel about technology, the stories we tell ourselves can save us—if we can just escape the cool veneer of our dystopian house of horrors. Dois dias mais tarde, Devon Maloney contrapôsDystopian fiction mimics what it actually feels like to be in the world, so if it ends up scaring people, well, that’s because the world is scary. A verdade, a haver uma verdade, andará decerto a meio caminho de ambas as teses; e se é certo que a distopia sempre fez parte da ficção científica (sendo mesmo um dos seus géneros mais conhecidos - e apreciados - fora das suas fronteiras tradicionais), nem por isso deixa de ser verdade que falta à ficção científica moderna o optimismo e a esperança das histórias de outros tempos. Star Trek, que Solana refere de passagem, é em si todo um programa: nos remakes modernos, até a célebre frase de abertura to boldly go where no man has gone before deu lugar ao enfadonho Into Darkness

No portal da Tor, Chris McCrudden expõe doze razões para ler (e adorar) a série Discworld de Terry Pratchett. São doze boas razões (a Granny Weatherwax será talvez a melhor personagem da fantasia contemporânea), ainda que me veja obrigado a discordar do ponto 3: The Colour of Magic até pode ser o mais genérico de todos os livros de Discworld, mas é também o ponto de partida de toda a série; como tal, qualquer leitor que queira realmente conhecer o extraordinário universo ficcional que Pratchett desenvolveu ao longo das últimas três décadas deverá começar aqui, na aventura original de Rincewind e Twoflower, e deixar-se levar. É verdade que praticamente* cada livro de Discworld pode servir de porta de entrada para a série, mas há algo de muito gratificante na leitura sequencial, acompanhando a maturação da prosa e do estilo de Pratchett, e desvendando algumas piadas que só fazem sentido se o leitor já estiver familiarizado com alguns elementos de livros anteriores, por mais laterais que possam ser. 

No io9Annalee Newitz pergunta se alguma vez assistiremos a um fenómeno de cultura popular equivalente a Star Wars. Diria que já assistimos a um fenómeno aproximado, ainda que tenha partido do meio literário: Harry Potter. Num artigo não relacionado no Boing BoingCaroline Siede deixa algumas pistas para explicar como a série de livros de J. K. Rowling ajudou a moldar uma geração inteira, tendo um impacto assinalável em miúdos e graúdos um pouco por todo o mundo. 

Trigger Warning: Short Fictions and Disturbances é o título da próxima colectânea de ficção curta de Neil Gaiman, com publicação prevista para o início de Fevereiro próximo. De acordo com o próprio Gaiman (via tumblr), ainda está a trabalhar no último conto da colecção. 

Fontes: WiredTor / io9 / Boing Boing 

* Há excepções. Sugerir The Light Fantastic como primeiro livro a ler é disparatado, já que este é uma sequela directa de The Colour of Magic. Da mesma forma, Lords and Ladies surge na sequência directa de Witches Abroad, e não será talvez a melhor leitura para entrar em Discworld

27 de agosto de 2014

Dungeons & Dragons, parte 1: Tempestade perfeita

Um ano antes de a primeira parte da trilogia The Lord of the Rings, The Fellowship of the Ring, estabelecer uma fasquia praticamente impossível de superar pela fantasia épica cinematográfica (e pelas adaptações da fantasia literária, já agora), houve um outro filme, um tanto ou quanto obscuro, que se encarregou de resumir em 107 minutos todos os disparates que o género conheceu na suas várias aparições no grande ecrã. Para os mais distraídos, esse filme foi Dungeons & Dragons, uma aventura de fantasia baseada de forma muito vaga naquele que será porventura o mais célebre de todos os jogos de personagens de pen & paper. O estrago que o filme terá feito em futuras adaptações dos universos ficcionais de outros jogos será talvez difícil de estimar*, mas não terá decerto feito quaisquer favores tanto aos jogadores de D&D como a quem apenas conhecia o jogo pela sua presença algo fugaz na cultura popular, que há catorze anos não se encontrava dominada pela cultura geek

Isto porque, para todos os efeitos - e não há mesmo outra forma de dizê-lo -, Dungeons & Dragons é um daqueles raros filmes que se revela a tempestade perfeita, no qual um espectador com um módico de seriedade não consegue vislumbrar, por um segundo que seja, algo acertado. Não há um elemento razoável no filme - algo capaz de redimir a empreitada e de mitigar, por pouco que seja, o desastre. Nada disso: o despiste começa no curto prólogo com a mais genérica das narrações a introduzir o sistema de classes do mundo (Izmir, um nome igualmente genérico), e prolonga-se num choque em cadeia de proporções épicas até ao final insosso e previsível desde o primeiro momento.


Dizer que o worldbuilding de Dungeons & Dragons é preguiçoso é um insulto ao pecado mortal: todo o enredo parece levantado directamente de algum manual do género Fantasy for Dummies com uns pozinhos de ideais de uma Revolução Francesa de quinta categoria: Izmir vive dividido entre os privilegiados Feiticeiros, que detém o poder, e o povo ignorante, semi-escravizado (o papel de outras raças, como os elfos e os anões - cada uma com o seu token character - ou todas as outras que aparecem numa cena decalcada da cantina de Mos Eisley em versão franciscana-fantástica, esse, permanece um mistério). A Imperatriz, jovem e ingénua, quer libertar o povo oprimido; o feiticeiro mau quer manter o status quo; e dois ladrões improváveis vão aliar-se a uma feiticeira novata (e a uma elfa e a um anão que, enfim, importam tão pouco que se desaparecessem a sua ausência não seria notada) para, como é evidente, resolver a embrulhada. 


Pelo meio há dragões - que aparentemente podem ser controlados pela imperatriz, e que o feiticeiro mau quer controlar (claro), mas que ninguém sabe muito bem de onde vêm, para onde vão, e que impacto têm naquele mundo. E há masmorras, como não podia deixar de ser - o título do filme, afinal, só será publicidade enganosa para os mais distraídos. Há longas sequências de masmorras tão decalcadas de Indiana Jones que o espectador que assista ao filme no conforto da sua sala quase se sentirá tentado a trocar o DVD pelo de Raiders of the Lost Ark (ou mesmo a interromper o filme para ir jogar Tomb Raider na consola mais próxima), com todas as armadilhas obrigatórias e mais algumas, sempre desinspiradas.


A transportar tudo isto está um elenco onde em circunstâncias normais se encontraria talento - quanto mais não seja em Jeremy Irons e em Thora Birch. Mas, convém lembrar, estamos em Dungeons & Dragons: a direcção de actores é inexistente (ou está embriagada), e os actores, decerto com o cheque nos bolsos e bem cientes da pobreza do guião, optaram ou por não se empenhar de todo (Birch) ou por se empenhar em demasia (Irons). A Imperatriz Savina de Birch é o aborrecimento em pessoa, sempre monocórdica e enjoada; e o Profion de Irons é tão over the top que se revela praticamente indescritível - o seu desempenho assume quase a forma de uma performance. Pelo meio, os dois protagonistas (Justin Whalin e Marlon Wayans) surgem estereotipados e com deixas terríveis (com o Snails de Wayans a ser irritante ao extremo na sua imitação rasca da personagem de Chris Tucker em The Fifth Element), a feiticeira Marina de Zoe McLellan revela-se uma Hermione Granger que não vai além do "Satisfaz Menos" e o Damodar de Bruce Payne, o capataz de Profion, está sempre empenhado em conquistar o prémio de vilão mais incompetente da fantasia cinematográfica. 


A banda sonora genérica, a fotografia indigente e os efeitos especiais terríveis (sobretudo para um filme cuja estreia saiu "encaixada" entre portentos visuais como The Matrix e The Lord of the Rings) são os últimos pregos num autêntico caixão de contraplacado - e tornam o orçamento de 45 milhões de dólares num enigma absoluto. E é isto, Dungeons & Dragons - a transposição para o grande ecrã de um dos mais fascinantes e duradouros jogos de fantasia alguma vez criados, num filme a todos os níveis terrível. Mau guião, mau enredo, maus diálogos, más personagens, mau universo ficcional, maus efeitos especiais, má música - nada ali é salvável. Não merece avaliação nem pelo esforço - pois este, convenhamos, foi inexistente. 02/10

Dungeons & Dragons (2000)
Realizado por Courtney Solomon
Guião de Topper Lillien e Carroll Cartwright
Com Jeremy Irons, Thora Birch, Bruce Payne, Justin Whalin, Marlon Wayans, Zoe McLellan e Robert Miano
107 minutos


* Estará longe de ser uma extrapolação pacífica, mas talvez mereça o risco: só nos últimos dois anos - catorze anos depois de Dungeons & Dragons - os projectos de realizar filmes sobre os universos ficcionais de jogos de grande popularidade como Warcraft e Magic: the Gathering começaram a ser de facto desenvolvidos. É claro que a causalidade é improvável ao ponto da inverosimilhança, mas ainda assim: apesar de Magic estar hoje no pico da sua popularidade, os anos de ouro de Warcraft, esses, são hoje uma memória. 

26 de agosto de 2014

Dungeons & Dragons, parte 2: Comédia acidental

Numa época em que o SyFy Channel fez do camp o seu sustento e elevou para o estatuto de culto todo um conjunto de filmes-catástrofe (em ambos os sentidos) que, para todos os efeitos, são ficção científica televisiva de Série F ou algo que lhe valha, fará algum sentido repescar Dungeons & Dragons e analisá-lo a partir de outro ponto de vista. O fenómeno, aliás, é já antigo, e antecede o próprio Ed Wood, mestre na arte: os tais filmes que, de tão maus que são em todos os aspectos que se possam conceber, se tornam em objectos fascinantes e irresistíveis. Como quem abranda para assistir ao resultado do desastre na auto-estrada. Neste campo, e no que à fantasia cinematográfica diz respeito (um género onde as obras-primas nunca foram abundantes), será talvez difícil encontrar rival para o Dungeons & Dragons do contrariado Courtney Solomon: por mais interessante que seja o exercício de fazer algo propositadamente mau, conceber tamanho desastre por acaso é um facto tão extraordinário que acaba por ter mérito.

Invertamos, portanto, a escala: à luz dos filmes-tão-maus-que-se-tornam-clássicos, Dungeons & Dragons é um portento - um cocktail improvável e explosivo de tudo o que um filme pode ter de mau elevado à décima potência. Mas que acaba por se revelar num caso interessantíssimo de comédia acidental pelo empenho do seu elenco, apostado em disparatar tanto quanto possível. Para quem não acreditar, aqui fica a "prova A":



Descontemos os efeitos especiais miseráveis que animam o dragão: nesta curta cena, logo nos primeiros minutos do filme, vemos Jeremy Irons no seu mais perfeito modo ham & cheese: descrever o seu desempenho como exagerado passa por eufemismo. Mas é mesmo isso que torna o seu Profion num vilão tão memorável: até a sua gargalhada maléfica, derradeira imagem de marca de qualquer vilão que se preze, surge numa caricatura tal que Bruce Payne, ao seu lado, mal consegue conter o riso. O registo mantém-se constante ao longo dos 107 minutos do filme: caricato, disparatado e irresistível. Em suma, e aludindo às palavras do próprio: o inverso daquilo que Alec Guiness fez em Star Wars em termos de gravitas, mas de uma forma incomparavelmente mais divertida.


O resto do elenco não ajuda, note-se: a apatia de Thora Birch no papel de Imperatriz Savina e a estranheza dede Bruce Payne como Damodar (é um desempenho difícil de descrever por ser ao mesmo tempo tão morto e tão exagerado) acabam por reforçar a veia cómica e over the top de Profion. O que se nota especialmente quando entram em cena os comic reliefs do filme: Snails (Marlon Wayans) e o anão Elwood (Lee Arenberg) esforçam-se nos seus gags e nas suas imitações grosseiras, mas nunca conseguem alcançar o patamar cómico do vilão. Convenhamos, porém, que em momento algum o guião ajudou: para além dos diálogos pedestres e dos clichés martelados, ainda produziu momentos tão bizarros que só podem funcionar como comédia.


Quando juntamos a este caldo efeitos especiais mais fracos que os de qualquer produção televisiva de orçamento médio (daquela época) e um mundo ficcional construído às três pancadas e sem qualquer vislumbre de substância e de complexidade, o resultado  só pode ser um desastre - mas um desastre tornado hilariante pelo ridículo das suas situações e pelo exagero das suas persoangens. Levado a sério, Dungeons & Dragons é um fracasso inapelável; mas se encarado com humor, revela-se numa das mais inspiradas comédias acidentais da memória recente, um clássico camp que quase podemos descrever como o The Room da fantasia cinematográfica. Que o tenha feito com o título de uma das mais importantes marcas registadas do género acaba por tornar tudo ainda mais surreal. -09/-10

Dungeons & Dragons (2000)
Realizado por Courtney Solomon
Guião de Topper Lillien e Carroll Cartwright
Com Jeremy Irons, Thora Birch, Bruce Payne, Justin Whalin, Marlon Wayans, Zoe McLellan e Robert Miano
107 minutos

24 de agosto de 2014

Orson Scott Card (1951 - )

Orson Scott Card comemora hoje o seu 63º aniversário. Ender's Game, de 1985, será sem dúvida o seu romance mais conhecido - a história do jovem Andrew "Ender" Wiggin e da sua educação violenta para se tornar num estratega capaz de derrotar os invasores extra-terrestres tornou-se num fenómeno duradouro e num dos textos mais populares da ficção científica literária. Com Ender e com a sua primeira sequela, Speaker for the Dead (1986), Card tornou-se no primeiro (e até agora único) autor a vencer os prémios Hugo e Nébula na categoria de "Melhor Romance" em dois anos consecutivos. No universo ficcional de Ender já foram publicados 15 romances, estando mais alguns previstos; na bibliografia de Card merece ainda destaque a série Tales of Alvin Maker, iniciada em 1987 com o romance The Seventh Son. Para assinalar a efeméride, fica aqui a referência para o pequeno texto biográfico publicado no ano passado

18 de agosto de 2014

Terry Pratchett: "(...) a good fantasy is just a mirror of our own world, but one whose reflection is subtly distorted" (entrevista)

Com quarenta romances publicados desde 1983 (mais alguns companion books) e milhões de exemplares vendidos em todo o mundo, a série Discworld de Terry Pratchett é um caso raro de longevidade e de qualidade na fantasia literária, com as suas sátiras tão inteligentes como provocadoras, as suas personagens cativantes para leitores de todas as idades, e, claro, o seu humor inconfundível. Em entrevista ao diário norte-americano The New York Times, Pratchett fala sobre os seus gostos, sobre os seus heróis literários e sobre o impacto que a leitura de The Wind in the Willows teve durante a sua infância - e, de caminho, ainda dá a resposta perfeita à inevitável pergunta de Verão sobre que livros escolher para a proverbial ilha deserta. Alguns excertos:
New York Times: Who are your favorite fantasy novelists?
Terry Pratchett: O.K., I give in. J. R. R. Tolkien. I wrote a letter to him once and got a very nice reply. Just think how busy he would have been, and yet he took the time out to write to a fan. 
NYT: What makes for a good fantasy novel?
TP: The kind that isn’t fantastic. It’s just creating a new reality. Really, a good fantasy is just a mirror of our own world, but one whose reflection is subtly distorted.
(...)
NYT: Which novels have had the most impact on you as a writer? Is there a particular book that made you want to write?
TP: It has to be “The Wind in the Willows.” It fascinated me. He had toads living in great country houses and badgers and moles acting like British gentlemen. I read the pages so often they fell apart, and God bless him for leaving in the pieces called “Wayfarers All” and “The Piper at the Gates of Dawn.” I am sorry to say that certain publishers, who really should know better, have produced editions with those pieces cut from that wonderful book, stating they were simply too heavy for children. I scream at stuff like that. After all, “The Pilgrim’s Progress” was a book written for children. A good book, no matter its intended audience, should get people reading, and that’s what started me writing. And once I started, I never stopped.
A entrevista completa pode ser lida no The New York Times.

Fonte: SF Signal

17 de agosto de 2014

Citação fantástica (148)

To light a candle is to cast a shadow.

Ursula K. Le Guin, A Wizard of Earthsea (1968)

3 de agosto de 2014

Aconteceu em Agosto:

02 de Agosto:
  • 1954 - Nasceu Ken MacLeod, escritor escocês de ficção científica mais conhecido pela sua hard SF e pelas suas space operas. Na sua bibliografia merecem destaque a série Fall Revolution (The Star Fraction, The Stone Canal, The Cassini Division e The Sky Road, publicados entre 1995 e 1999 e reeditados em dois volumes omnibus em 2009) e a trilogia Engines of Light (Cosmonaut Keep, Dark Light e Engine City, editados entre 2001 e 2003).
03 de Agosto:
  • 1904 - Nasceu Clifford D. Simak, autor norte-americano de ficção científica que se notabilizou durante a "Golden Age" do género. Venceu o prémio Hugo na categoria de "Melhor Romance" com Way Station, de 1964; a sua bibliografia inclui ainda títulos como Time and Again (1951) e Ring Around the Sun (1953), para além de inúmeros contos. Faleceu a 25 de Abril de 1988. 
06 de Agosto:
  • 1934 - Nasceu Piers Anthony (nome de baptismo: Piers Anthony Dillingham Jacob), um dos mais prolíficos autores contemporâneos de ficção e fantasia e de fantasia. Entre outras séries literárias, é o criador da saga de fantasia Xanth, iniciada em 1977 com A Spell for Chameleon e continuada desde então em 38 livros. 
  • 1966 - faleceu Cordwainer Smith (nome de baptismo: Paul Myron Anthony Linebarger), mestre de ficção curta durante a "Golden Age" da ficção científica e criador do universo ficcional conhecido como Instrumentality of Mankind, que serve de pano de fundo a boa parte dos seus contos. Scanners Live in Vain (1950), The Game of Rat and Dragon (1955), When the People Fell (1959) e A Planet Named Named Shayol (1961) são os títulos de alguns dos seus contos mais célebres. A título póstumo, os romances curtos Planet Buyer e The Underpeople, de 1964 e 1968, foram reunidos a título póstumo num volume intitulado Nostrilia, de 1975. Natural de Milwaukee, no Winsconsin, Cordwainer Smith nasceu a 11 de Julho de 1913. 
  • 1972 - Nasceu Paolo Bacigalupi, autor norte-americano de ficção científica que se estreou na ficção longa em 2009 com o romance The Windup Girl, obra vencedora dos prémios Hugo e Nébula na categoria de "melhor romance", e do Locus como "melhor primeiro romance". Bacigalupi é ainda o autor de Ship Breaker (2910) e The Drowned Cities (2012), assim como de alguma ficção curta reunida na colectânea de 2008 Pump Six and Other Stories.
07 de Agosto:
  • 1933 - Nasceu Jerry Pournelle, autor norte-americano de ficção científica que se notabilizou pela sua ficção científica militar e pelas suas colaborações regulares com Larry Niven, da qual resultaram romances como The Mote In God's Eye (1975) e Lucifer's Hammer (1977), entre muitos outros. Na sua bilbiografia pessoal incluem-se títulos como High Justice (1974), Birth of Fire (1976) e The Mercenary (1977).
09 de Agosto:
  • 1927 - Nasceu Daniel Keyes, autor de Flowers for Algernon. Faleceu a 15 de Junho de 2014.
  • 1947 - Nasceu John Herbert Varley, autor norte-americano de ficção científica, em cuja bibliografia encontramos a trilogia Gaea (TitanWizard e Demon, de 1979, 1980 e 1984), a série Eight Worlds (Steel Beach e The Golden Globe, de 1992 e 1998) e a trilogia Thunder and Lightning (Red Thunder, Red Lightning e Rolling Thunder, de 2003, 2006 e 2008). 
13 de Agosto:
  • 1946 - Faleceu Herbert George "H.G." Wells, amplamente considerado um dos fundadores da ficção científica moderna com alguns dos mais icónicos romances que o género conheceu na primeira metade do século XX: títulos como The War of the Worlds (), The Time Machine (), The Invisible Man () ou The Island of Doctor Moreau () são há muito clássicos incontornáveis da ficção científica, tendo contribuído para o estabelecimento de ideias, conceitos e convenções que fazem parte do ideário do género, com várias adaptações cinematográficas e televisivas. E algumas das suas personagens tornaram-se parte da cultura popular contemporânea, e foram trabalhadas por autores diversos numa grande variedade de histórias. H. G. Wells nasceu a 21 de Setembro de 1866.
15 de Agosto:
  • 2012 - Faleceu Harry Harrison (nome de baptismo: Henry Maxwell Dempsey), autor norte-americano de ficção científica que se consagrou em 1966 com a distopia populacional Make Room! Make Room!, adaptada para o cinema em 1973 no célebre Soylent Green. Na sua bibliografia merece ainda destaque The Stainless Steel Rat (1961), continuado em várias sequelas e também transposto para banda desenhada, e a personagem Bill, the Galactic Hero. Harry Harrison nasceu a 12 de Março de 1925. 
16 de Agosto:
  • 1884 - Nasceu Hugo Gernsback, norte-americano de origem luxemburguesa que se notabilizou sobretudo como editor - e cujo trabalho em várias revistas especializadas durante a primeira metade do século XX foi de tal forma relevante que se tornou numa das figuras fundadoras da ficção científica enquanto género literário. Em 1926 fundou a Amazing Stories, a primeira revista especializada de ficção científica, que serviu de rampa de lançamento a alguns dos mais consagrados autores que o género conheceu. Os prémios Hugo, atribuídos anualmente na World Science Fiction Convention (Worldcon) desde 1953, foram criados em sua homenagem. Hugo Gernsback faleceu a 19 de Agosto de 1967.
  • 1954 - Nasceu James Francis Cameron, realizador e produtor canadiano responsável por alguns dos maiores êxitos da história do cinema. Terminator (1984), Aliens (1986), The Abyss (1989), Terminator 2: Judgment Day (1991) e Avatar (2009) constituem o seu legado na ficção científica cinematográfica. 
18 de Agosto:
  • 1925 - Nasceu Brian Wilson Aldiss, autor, editor, antologista e crítico britânico de ficção científica. Na sua bibliografia incluem-se romances como Non-Stop (1958), The Interpreter (1960), Hothouse (1962), Graybeard (1964), e a célebre e ambiciosa trilogia Helliconia, composta por Helliconia Spring (1982), Helliconia Summer (1983) e Helliconia Winter (1955), para além de várias colectâneas de ficção curta - entre a qual se inclui o conto Super-Toys Last All Summer Long (1969), que Steven Spielberg adaptou para o cinema em A.I. (no seguimento do projecto de Stanley Kubrick). Como antologista, organizou várias antologias de ficção científica para a Penguin Books, e editou com Harry Harrison a série anual de antologias The Year's Best Science Fiction entre os números 1 e 6 (1968 - 1973). Ao longo da sua carreira conquistou dois prémios Hugo, um Nénbula e o John W. Campbell Memorial. 
20 de Agosto:
  • 1890 - Nasceu Howard Philips "H.P." Lovecraft, um dos mais consagrados autores de horror literário - ainda que o seu reconhecimento tenha sido sobretudo póstumo (Lovecraft faleceu a 15 de Março de 1937). Foi o criador do Chtulhu Mythos e da ficção original que lhe está associada. 
  • 1951 - Nasceu Gregory Dale "Greg" Bear, autor norte-americano de fantasia e ficção científica. A sua vasta bibliografia inclui romances em universos ficcionais que não são da sua autoria (Halo, Star Trek, Star Wars), mas merece destaque sobretudo pelas suas obras originais: Darwin's Radio (1999) e Darwin's Children (2003), The Forge of God (1987) e Anvil of Stars (1992), a série The Way (Eon, Eternity e Legacy, de 1985, 1988 e 1995), Blood Music (1985) e Hull Zero Three (2010), entre muitos outros. 
21 de Agosto:
  • 1911 - Nasceu Anthony Boucher (nome de baptismo: William Anthony Parker), editor e autor de contos de ficção científica e de mistério. Foi um dos fundadores da Magazine of Fantasy and Science Fiction. Faleceu a 29 de Abril de 1968. 
22 de Agosto:
  • 1920 - Nasceu Ray Douglas Bradbury, um dos mais consagrados autores norte-americanos do século XX, e com uma carreira excepcional em géneros literários como a ficção científica, a fantasia, o horror e o mistério. Dono de uma prosa memorável, Bradbury deixou como legado à ficção científica as inesquecíveis The Martian Chronicles (1950), romances como The Illustrated Man (1951) e Something Wicked This Way Comes (1962) - e, claro, Fahrenheit 451, de 1953, uma das mais aclamadas distopias literárias, adaptada para o cinema por François Truffaut em 1966. Ray Bradbury faleceu a 5 de Junho de 2012.
24 de Agosto:
  • 1915 - Nasceu James Triptree, Jr. (nome de baptismo: Alice Bradley Sheldon), autora norte-americana cujo pseudónimo masculino escondeu a sua verdadeira identidade - e, mais importante, o seu género - até 1977. A revelação causou uma polémica assinalável no meio, e contribuiu de forma decisiva para o debate do preconceito de género na ficção científica (tema que ainda hoje é recorrente, tantos anos volvidos). James Tiptree distinguiu-se sobretudo pela sua ficção curta e provocadora, que lhe assegurou vários prémios Hugo e Nébula; Love Is the Plan the Plan Is Death (1973), The Girl Who Was Plugged In (1973), Houston, Houston, Do You Read? (1977) e The Screwfly Solution (1977) são alguns dos seus contos mais conhecidos. James Tiptree, Jr. faleceu a 19 de Maio de 1987. 
  • 1951 - Nasceu Orson Scott Card, autor de ficção científica norte-americano -  e único autor até ao presente a vencer em dois anos consecutivos os prémios Hugo e Nébula na categoria de "Melhor Romance", com Ender's Game e Speaker for the Dead, de 1985 e 1986. A série do jovem Ender, uma criança-prodígio manipulada para se tornar num estratega militar capaz de derrotar uma raça alienígena invasora, tornou-se numa das mais populares da ficção científica moderna; Card deu-lhe continuidade directa em várias sequelas, e na série paralela que abriu com Ender's Shadow (1999). Da sua autoria são ainda as séries Alvin Maker, inciada em 1988 com Seventh Son e continuada em várias sequelas até ao presente, e a série Homecoming, que tem em The Memory of Earth (1992) o primeiro dos seus cinco volumes. 
  • 2010 - Faleceu Satoshi Kon, animador e realizador japonês que assinou alguns clássicos recentes da animação japonesa como Perfect Blue (1997), Millennium Actress (2001), Tokyo Godfathers (2003) e Paprika (2006), assim como a série televisiva Paranoia Agent (2004). Satoshi Kon nasceu a 12 de Outubro de 1963.
26 de Agosto:
  • 1995 - Faleceu John Brunner, autor britânico de fantasia e ficção científica cuja carreira começou ainda nos anos 50 com space operas de cariz mais ou menos pulp - até ao advento da "New Wave" da ficção científica, movimento do qual se tornou um dos mais relevantes autores com um quarteto de romances que se tornariam clássicos pelo seu arrojo conceptual e pela sua antecipação temática e de tendências da própria ficção científica literária. Com a distopia populacional de Stand on Zanzibar (1968), Brunner venceu os prémios Hugo e BSFA; seguiram-se The Jagged Orbit (1969), The Sheep Look Up (1972) e The Shockwave Rider (1975), entre outros romances e contos que continou sempre a escrever. Judas é o título do conto que submeteu à antologia Dangerous Visions (1967), de Harlan Ellison; a sua ficção curta encontra-se compilada em várias colectâneas. John Brunner nasceu a 24 de Setembro de 1934, e faleceu durante a Worldcon de 1995 em Glasgow. 
28 de Agosto:
  • 1916 - Nasceu John Holbrook "Jack" Vance, autor norte-americano de fantasia, ficção científica e mistério que se distinguiu pela sua obra multifacetada e influente. The Dying Earth será sem dúvida a sua série mais conhecida, uma fantasia num futuro pós-apocalíptico explorado ao longo de quatro volumes: The Dying Earth (1950), The Eyes of the Overworld (1966), Cugel's Saga (1983) e Rhialto the Marvellous (1984). A trilogia Lyonesse (Lyonesse, The Green Pearl e Madouc, de 1983, 1985 e 1989 respectivamente) e o romance Emphyrio (1969) merecem igualmente destaque na sua vasta bibliografia. Jack Vance faleceu a 26 de Maio de 2013.
  • 1948 - Nasceu Vonda Neel McIntyre, autora norte-americana de ficção científica. Dreamsnake, de 1978, venceu os prémios Hugo e Nébula na categoria de romance; derivou da noveleta Of Mist, and Grass, and Sand, de 1973, que já tinha sido reconhecida com um Nébula. Na sua bibliografia encontra-se a série Starfarers (Starfarers, Transition, Metaphase e Nautilus, de 1989, 1991, 1992 e 1994), que surgiu a partir de uma série televisiva imaginada. McIntyre escreveu ainda vários romances para os universos alargados de Star Trek e Star Wars
30 de Agosto:
  • 1797 - Nasceu Mary Shelley (nome de baptismo: Mary Wollstonecraft Godwin), escritora, dramaturga e ensaísta inglesa cujo romance Frankenstein: or, The Modern Prometheus é hoje considerado como um dos textos fundadores da ficção científica literária. Mary Shelley faleceu a 1 de Fevereiro de 1851.
31 de Agosto:
  • 1965 - Faleceu Edward Elmer Smith, conhecido como E. E. "Doc" Smith", autor norte-americano da "Golden Age" da ficção científica, que conheceu grande popularidade nas décadas de 30, 40 e 50. É considerado um dos fundadores da space opera enquanto sub-género da ficção científica; as séries Skylark e Lensman são da sua autoria. "Doc" Smith nasceu a 2 de Maio de 1890.

23 de julho de 2014

Gardner Dozois (1947 - )

Ainda que tenha vencido em duas ocasiões o Prémio Nébula na categoria de "Melhor Conto" - em 1983 com o conto The Peacemaker e em 1984 com Morning Child -, e que tenha uma produção assinalável de ficção curta, compilada desde o final dos anos 70 em várias colectâneas, Gardner Dozois é conhecido no meio da fantasia e da ficção científica sobretudo pela sua longa e reconhecida actividade como crítico, antologista e editor. A conquista de 15 Prémios Hugo em 17 anos na categoria de "Melhor Editor Profissional" reconhece em pleno a sua passagem pela revista Asimov's, a qual ajudou a fundar em 1977 e em cujas páginas foram publicados alguns dos mais conceituados autores que o género conheceu nas últimas quatro décadas. 

Como antologista, a actividade de Dozois é igualmente vasta - para além de inúmeras antologias individuais, editou entre 1989 e 2001 as antologias da Asimov's, e desde 1984 tem vindo a editar a série de antologias anuais The Year's Best Science Fiction - num total de 33 volumes publicados, com as 31 edições anuais e as duas edições comemorativas do vigésimo aniversário publicadas em 2005 e 2007. Entre 1982 e 2007 co-editou com Jack Dann a série de antologias temáticas da Ace Books, dedicadas a temas tanto de fantasia como de ficção científica, E nos últimos anos tem colaborado com George R. R. Martin em vários projectos temáticos que reúnem alguns dos melhores autores contemporâneos, dentro e fora do género. Songs of Dying Earth, de 2009, foi a primeira colaboração de ambos, num tributo ao popular universo ficcional de Jack Vance; seguiram-se Warriors (2010), Songs of Love and Death (2010), Down These Strange Streets (2011), Old Mars (2013), Dangerous Women (2013) e Rogues (2014). Na calha está já o próximo projecto, intitulado Old Venus, com lançamento previsto ainda para este ano.

Gardner Raymond Dozois nasceu em Salem, no Massachusetts, a 23 de Julho de 1947, e comemora hoje o seu 67º aniversário.

20 de julho de 2014

Citação fantástica (144)

All the history of human life has been a struggle between wisdom and stupidity.

Philip Pullman, The Amber Spyglass (1999)

14 de julho de 2014

Christopher Priest (1943 - )

Com quatro prémios British Science Fiction e um prémio World Fantasy na categoria de "Melhor Romance", a obra de Christopher Priest merece destaque no fantástico literário. Indoctrinaire marca a sua estreia no formato de romance em 1970; seguiram-se Fugue for a Darkening Island (1972), The Inverted World (1974), The Space Machine  (1976), A Dream of Wessex (1977), The Affirmation (1981), The Glamour (1984), The Extremes (1998) e The Separation (2002), entre outros. The Prestige, de 1995, será talvez o seu romance mais conhecido, com a história dos dois ilusionistas rivais a ter sido agraciada com o prémio World Fantasy e a ter conhecido uma adaptação cinematográfica de sucesso, realizada por Christopher Nolan com estreia em 2006. O seu mais recente romance, The Adjacent, data de 2013.

Na bibliografia de Christopher Priest destacam-se ainda quatro colectâneas de ficção curta. Na segunda, An Infinite Summer, de 1979, Priest reuniu três contos que marcam o início do seu "Dream Archipelago", o universo ficcional que viria a explorar poucos anos mais tarde em The Affirmation, e num dos seus romances mais recentes: The Islanders (2011). Aos contos originais juntar-se-iam alguns novos em 1999, com a colectânea The Dream Archipelago

No ensaio, merece destaque The Last Deadloss Visions, uma violenta (e virulenta) crítica de Priest àquele que será talvez o mais famoso livro de ficção científica nunca publicado: a antologia The Last Dangerous Visions, organizada por Harlan Ellison ainda nos anos 70. O ensaio original foi publicado no formato de uma fanzine de edição única, que se tornou tremendamente popular - e que deu origem a uma crítica mais elaborada, publicada em livro com o título The Book on the Edge of Forever, em 1993. 

Christopher Priest nasceu a 14 de Julho de 1943 em Cheshire, no Reino Unido, e celebra hoje o seu 71º aniversário.

11 de julho de 2014

World Fantasy Awards 2014: Os finalistas

Atribuídos desde 1975 na World Fantasy Convention, os World Fantasy Awards distinguem anualmente a melhor fantasia literária publicada no ano transacto - e os finalistas da edição de 2014 já são conhecidos. Os vencedores serão conhecidos no último dia da convenção, que neste ano terá lugar de 6 a 9 de Novembro em Washington, D.C.. Para além das nomeações por categoria (ver abaixo), são já conhecidas as vencedoras deste ano do Life Achievement Award: a escritora Chelsea Quinn Yabro e a editora Ellen Datlow.

Romance:
  • Dust Devil on a Quiet Street, de Richard Bowes (Lethe Press)
  • A Natural History of Dragons: A Memoir by Lady Trent, de Marie Brennan (Tor Books)
  • The Ocean at the End of the Lane, de Neil Gaiman (William Morrow/Headline)
  • A Stranger in Olondria, de Sofia Samatar (Small Beer Press)
  • The Golem and the Jinni, de Helene Wecker (Harper/Blue Door)
  • The Land Across, de Gene Wolfe (Tor Books)
Novela:
  • Wakulla Springs, de Andy Duncan e Ellen Klages (Tor.com, Outubro de 2013)
  • Black Helicopters, de Caitlín R. Kiernan (Subterranean Press)
  • The Sun and I, de KJ Parker (Subterranean, Verão de 2013)
  • Burning Girls, de Veronica Schanoes (Tor.com, Junho de 2013)
  • Six-Gun Snow White, de Catherynne M. Valente (Subterranean Press)
Conto:
  • The Ink Readers of Doi Saket, de Thomas Olde Heuvelt (Tor.com, Abril de 2013)
  • The Prayer of Ninety Cats, de Caitlín R. Kiernan (Subterranean, Primavera de 2013)
  • Effigy Nights, de Yoon Ha Lee (Clarkesworld, Janeiro de 2013)
  • Selkie Stories Are for Losers, de Sofia Samatar (Strange Horizons, Janeiro de 2013)
  • If You Were a Dinosaur, My Love, de Rachel Swirsky (Apex Magazine, Março de 2013)
Antologia:
  • xo Orpheus: Fifty New Myths, ed. Kate Bernheimer (Penguin Books)
  • Queen Victoria’s Book of Spells: An Anthology of Gaslamp Fantasy, eds. Ellen Datlow e Terri Windling (Tor Books)
  • Flotsam Fantastique: The Souvenir Book of World Fantasy Convention 2013, ed. Stephen Jones (Smith & Jones/PS Publishing)
  • Dangerous Women, eds. George R.R. Martin e Gardner Dozois (Tor Books/Voyager UK)
  • End of the Road: An Anthology of Original Short Stories, ed. Jonathan Oliver (Solaris Books)
  • Fearsome Journeys: The New Solaris Book of Fantasy, ed. Jonathan Strahan (Solaris Books)
Colectânea:
  • North American Lake Monsters: Stories, de Nathan Ballingrud (Small Beer Press)
  • The Beautiful Thing That Awaits Us All and Other Stories, de Laird Barron (Night Shade Books)
  • The Ape's Wife and Other Stories, de Caitlín R. Kiernan (Subterranean Press)
  • Flowers of the Sea, de Reggie Oliver (Tartarus Press)
  • How the World Became Quiet: Myths of the Past, Present, and Future, de Rachel Swirsky (Subterranean Press)
Artista:
  • Galen Dara
  • Zelda Devon
  • Julie Dillon
  • John Picacio
  • Charles Vess
Prémio Especial - Profissional:
  • John Joseph Adams, pela sua actividade de edição de revistas e de antologias
  • Ginjer Buchanan, pela sua actividade de edição na Ace Books
  • Irene Gallo, pela direcção artística na Tor.com
  • William K. Schafer, pela Subterranean Press
  • Jeff VanderMeer e Jeremy Zerfoss, pelo Wonderbook: The Illustrated Guide to Creating Imaginative Fiction (Abrams Image)
Prémio Especial - Não-Profissional:
  • Scott H. Andrews, pela Beneath Ceaseless Skies
  • Marc Aplin, pela Fantasy-Faction
  • Kate Baker, Neil Clarke e Sean Wallace, pela Clarkesworld
  • Leslie Howle, pela administração do Clarion West
  • Jerad Walters, pela Centipede Press     

Fonte: SF Signal

10 de julho de 2014

Terry Pratchett cancela presença na convenção de Discworld

Terry Pratchett cancelou a sua ida a uma convenção de Discworld por motivos de saúde. O anúncio foi feito no portal da International Discworld Convention (que terá lugar em Manchester de 8 a 11 de Agosto). Nas palavras do próprio Pratchett,
I have been putting off writing this announcement for quite some time and on good days thought I wouldn’t have to write it at all. However, it is with great reluctance that I have to tell you all that I will not be able to attend the upcoming Discworld Convention in Manchester. I am very sorry about this, but I have been dodging the effects of PCA and have been able to write for much longer than any of us ever thought possible, but now The Embuggerance is finally catching up with me, along with other age-related ailments. I know people will have already made plans far in advance and some will be travelling a long way, but this is the first time ever that I have been unable to attend a UK convention and I really am very sorry. They say time marches on, and it does, even though I have been running very fast to keep one step ahead of it. I really was looking forward to seeing your smiley, happy faces. Have fun everyone. Yes, on this occasion, have lots of fun.
É uma notícia tão triste como inevitável, conhecendo-se há já alguns anos o caso de Alzheimer precoce de que padece - e, para todos os efeitos, Pratchett tem razão quando afirma que conseguiu continuar a escrever por mais tempo do que pensou ser possível (e é notável o humor com que se refere à doença, através da expressão embuggerance). De qualquer forma, e de acordo com o The Guardian, Pratchett tem mais um livro de Tiffany Aching "well underway" - a confirmar-se a conclusão e a publicação, este será o quinto livro do arco narrativo young adult da jovem feiticeira, e o 41º livro da série Discworld.


J. K. Rowling lança um novo conto de Harry Potter

A notícia espalhou-se pela Internet mais depressa do que fiendfyre na Sala das Necessidades: J. K. Rowling publicou no Pottermore, o site/comunidade online oficial do universo ficcional de Harry Potterum novo conto que surge na continuidade do epílogo do sétimo livro, The Deathly Hallows - e que assume a forma de um artigo da jornalista Rita Skeeter a propósito da presença dos protagonistas, muitos anos após o desfecho da série, na final do campeonato mundial de Quidditch na Patagónia. Com o título Dumbledore's Army Reunites at Quidditch World Cup Final, é uma leitura muito rápida e, para os apreciadores da série, decerto bastante divertida - Rowling recorre com engenho à escrita e ao estilo próprios de algum jornalismo (refiro-me evidentemente ao yellow journalism) para fazer um apanhado sobre as várias personagens principais, deixar algumas pistas sobre outras tantas secundárias, e, como não podia deixar de ser se considerarmos o tom e a narradora, especular sobre vários acontecimentos. E é precisamente nesta especulação que o conto se revela interessante. 

O texto está disponível gratuitamente no Pottermore (requer registo - uma barreira que decerto não será obstáculo na Internet).

Fonte: The Verge

8 de julho de 2014

The Dark Crystal: Quando a jornada do herói encontra as criaturas de Jim Henson

Será porventura fácil - demasiado fácil, dirá talvez quem tiver idade e memória para se lembrar -, perante os avanços prodigiosos das computer generated images, esquecer que houve um tempo em que os filmes de fantasia e de ficção científica eram feitos com outra tecnologia de ponta - com marionetas, maquetas, criações mecânicas, cenários reais, efeitos práticos, e uma dose inexcedível de talento, criatividade e esforço para tornar as imagens da imaginação em algo tangível. E nessa medida, submersos pelos efeitos especiais hiper-realistas alimentados pela cenografia virtual, pela imagem visual e pela motion capture, será talvez fácil para o público contemporâneo arrumar na prateleira do "datado" o espantoso legado de Jim Henson, um dos mais originais, criativos e audazes criadores que o entretenimento audiovisual (podemos falar tanto de televisão como de cinema) alguma vez conheceu. Muito se poderia dizer sobre Henson e sobre o seu célebre "Creature Shop", ainda hoje responsável pela animação de muitas criaturas do cinema fantástico (Where the Wild Things Are, de Spike Jonze, foi uma das mais recentes produções a contar com a colaboração do Jim Henson Creature Shop), e sobre programas clássicos como The Mupper Show ou Sesame Street, com as suas inesquecíveis marionetas. Talvez um dia me aventure nesse tema; hoje, porém, merece destaque uma das suas longas metragens, um clássico de culto de fantasia sem um único ser humano à vista: The Dark Crystal


Concebido com o propósito de se afastar do humor e da ligeireza das suas outras produções de se aproximar um pouco mais das raízes mais sombrias dos contos de fadas originais, The Dark Crystal coloca a sua história num mundo novo e original - Thra, um planeta iluminado por três sóis e alimentado pela magia de um "cristal encantado". O design conceptual e de personagens é de Brian Froud, cujas ilustrações de fantasia capturaram a atenção de Henson. Toda a cenografia do filme é magnífica, dos espaços exteriores aos vários níveis do castelo dos Skeksis - e, claro, ao fascinante planetário de Aughra, em movimento constante. Mas onde a imaginação de Froud se excede é na criação das várias raças que povoam o mundo de Thra - dos Místicos pacíficos e em harmonia com a natureza aos vilões Skeksis, num misto de ave com réptil; dos Podlings pigmeus aos Gelflings, parecidos com elfos clássicos; e sem esquecer as inúmeras criaturas que se encontram naquela natureza. 


O design de Froud encontrou na realização e no engenho de Henson e do seu parceiro Frank Oz os seus complementos perfeitos - e onde The Dark Crystal se eleva é na sua ilimitada criatividade visual, que dá uma vida exuberante a todo aquele mundo. Todos os espaços estão povoados por criaturas selvagens - as florestas têm as suas feras, os seus monstros e os seus bichos de pequena dimensão, que vemos escapulir-se à passagem dos protagonistas; nas masmorras do castelo vêem-se pequenas criaturas rastejantes a fugir da luz para a escuridão. E os vários povos de Thra ganham vida com um magnífico trabalho de marionetas construídas com um nível de detalhe impressionante - são absolutamente realistas na sua aparência fantasiosa (e por vezes quase assustadora), e com uma caracterização individual muito inteligente. Em termos estéticos e visuais, The Dark Crystal foi revolucionário na sua época, na primeira metade dos anos 80; e hoje, mais de três décadas volvidas, está muito, muito longe de se poder considerar, em boa fé, datada. 


A estes elementos junta-se um voice acting excepcional e uma banda sonora impecável de Trevor Jones, perfeita no tom e na atmosfera que evoca - forças mais do que suficientes para compensar as fraquezas de The Dark Crystal, que acabam por surgir na sua vertente narrativa. Aqui, The Dark Crystal segue em larga medida os pergaminhos da fantasia literária na vertente Tolkieniana - um jovem de uma raça mais ou menos insignificante na luta de poder por aquele mundo descobre que é a pedra angular de uma profecia antiga, tendo de partir numa demanda mais ou menos sinuosa para impedir que o Mal triunfe e restaurar a paz e o equilíbrio natural originais. No caso, o protagonista é Jen, o último dos Gelflins, criado pelos sábios Místicos; e segundo uma profecia antiga, Jen terá de encontrar um fragmento do Cristal Encantado e restaurar a pureza original do Cristal quando os três sóis se alinharem - caso falhe, as trevas tomarão conta do mundo. 


É possível traçar o paralelismo com The Lord of the Rings ou encaixar as várias etapas do enredo no monomito de Joseph Campbell; em termos gerais, Henson não se afastou muito das convenções estabelecidas no género, e utiliza alguns recursos mais ou menos tradicionais para enquadrar toda a trama - a narração inicial é disso exemplo, estabelecendo a história de Thra e o conflito que lhe é nuclear (e ainda que os diálogos possam ser, a espaços, um pouco fracos, a narração introdutória é surpreendentemente boa na simetria que estabelece, deixando adivinhar um dos temas centrais do filme sem no entanto ser óbvia a esse respeito). Mas o arrojo conceptual que Henson e Oz empregaram na componente visual e no worldbuilding de The Dark Crystal acaba também por se reflectir em alguns aspectos da narrativa; e isso nota-se não só em alguns pormenores da premissa (a dualidade do conflito original), mas também - sobretudo, diria - nas personagens.


Aqui chegados, é interessante notar como os papéis clássicos são ao mesmo tempo seguidos e subvertidos - e a subversão é feita sobretudo através do elemento do género. Jen, o protagonista e centro da profecia que coloca toda a trama em marcha, não é o herói convencional - é hesitante, trapalhão, pouco dado à aventura, e a sua inegável coragem apenas se revela no último momento. A demanda, essa, prossegue pela influência de duas outras personagens, ambas femininas. 


A primeira, Aughra, é uma profetisa e astrónoma de origens desconhecidas, temperamento irascível e lealdade imprevisível (a sua neutralidade também tem muito que se lhe diga), que vive num planetário majestoso no topo de uma montanha, a partir do qual estuda o movimento dos astros e tece as suas profecias. A segunda é Kira, uma Gelfling orfã (como Jen), criada pelo povo Podling e com o dom de falar com os animais - para além de possuir a coragem, a determinação e a abnegação que normalmente são associadas ao herói. Em momento algum assume a posição de damsel in distress - é através dos seus dons e do seu engenho que se salva dos vários perigos que enfrenta, e é através da sua coragem que Jed consegue avançar na sua demanda. 


Com o cinema fantástico contemporâneo absolutamente dependente dos efeitos especiais computorizados, mais sofisticados a cada blockbuster, capazes de recriar com um realismo por vezes excessivo tudo aquilo que se consiga imaginar, torna-se ainda mais interessante rever The Dark Crystal, trinta anos volvidos desde a sua estreia - e apreciar esta relíquia do cinema pré-CGI, quando os efeitos práticos, as maquetas, as marionetas e os cenários reais trabalhados em pormenor eram a norma, e quando brevíssimas sequências de animação serviam para mostrar aquilo que de outro modo seria impossível de reproduzir. Visualmente assombroso pelo engenho com que constrói todo um mundo credível e familiar na sua estranheza, The Dark Crystal poderá limitar-se a contar uma história mais ou menos típica de fantasia, mas fá-lo com uma imaginação e com um charme que são raríssimos de encontrar hoje em dia no género. Já não se fazem mesmo filmes assim. 8.2/10


The Dark Crystal (1984)
Realizado por Jim Henson e Frank Oz
Argumento de Jim Henson e David Odell
Com Jim Henson, Kathryn Mullen, Frank Oz, Billie Whitelaw, Steve Whitmire e Dave Goelz
93 minutos

4 de julho de 2014

Sandman Vol. 2: The Doll's House: O sonho e o pesadelo

É difícil falar de The Sandman a partir de qualquer uma das suas divisões - fascículos, novelas gráficas em trade paperback. A teia que Neil Gaiman tece adensa-se a cada vinheta, e cada pequena história só na aparência se mostra isolada ou de importância passageira, servindo de catalisador para a trama avançar por caminhos que se manifestam com frequência inesperados. Há alguns meses, dediquei este espaço ao primeiro volume da colecção, Preludes & Nocturnes, que junta os primeiros oito fascículos e estabelece uma certa continuidade narrativa nos universos de comics da DC (o próprio Sandman, de resto, é recuperado de forma especialmente imaginativa por Gaiman). Por uma questão de simplificação, e por as edições em trade paperback estarem a marcar o ritmo (lento) da leitura, avançarei hoje para o segundo volume, The Doll's House

O primeiro aspecto a notar nos oito contidos em The Doll's House é o afastamento notório e progressivo deste universo ficcional da restante continuidade da DC/Vertigo - depois da aparição de várias personagens clássicas como John Constantine, Martian Manhunter e Dr. Destiny, Sandman afasta-se dos cameos  para se centrar nas suas próprias personagens e na sua própria intriga. E aqui, no seu território, começa a lançar sementes que decerto darão frutos inesperados enquanto desenvolve a história de Rose Walker, neta de Unity Kinkaid, que padeceu na adolescência do misterioso sono que se abateu sobre algumas pessoas na sequência da captura e do subsequente encarceramento de Morpheus, para voltar a acordar na velhice. Rose está intimamente ligada ao Sonho, e na sua trama unem-se as fugas tortuosas de quatro criaturas do domínio de Morpheus, que o Senhor dos Sonhos se vê obrigado a perseguir e a capturar. Desire e Despair, duas Endless como o protagonista, são introduzidas logo no início da trama, numa tentativa de manipulação dos acontecimentos, e do seu irmão mais velho, para fins que só Desire conhecerá. 

A forma como Gaiman desenvolve a história através de histórias, com detalhes na aparência laterais a assumirem grande importância mais à frente, assemelha-se quase a uma tapeçaria que o autor tece com mestria, dando forma a um padrão ininteligível cuja verdadeira imagem só se poderá adivinhar quando tudo estiver dito - a cada ponto evocando aquilo que ficou para trás e deixando indícios do que se seguirá. No prólogo, uma viagem até um passado proto-mitológico que conta a história da Rainha Nada e do seu romance trágico com o Senhor dos Sonhos, encontramos uma passagem intrigante, aludida por Desire mas intimamente ligada à passagem de Morpheus pelo Inferno em Preludes, e a antever aquele que será porventura o mais importante dos acontecimentos narrados no quarto volume, Season of Mists. Da fuga de Brute e Glob emerge, com discrição, a família Hall, cujo único descendente assumirá um papel determinante no desfecho de toda a série; e do interlúdio entre Morpheus e Hob Gadling, introduz de passagem William Shakespeare e Johanna Constantine, que não surgem aqui por acaso. Outro autor, com mais ambição do que talento, poderia aqui dar um passo maior do que a perna e dispersar a trama ao ponto de se revelar impossível atar as várias pontas soltas e restabelecer a coesão do arco narrativo principal, mas Gaiman não dá ponto sem nó: cada pormenor surge encaixado com precisão no momento certo, sem que em momento algum a trama se disperse sem propósito; e a cada nova passagem consegue surpreender pela imaginação das suas tramas (a convenção de serial killers é de antologia).

Em The Doll's House encontramos um Gaiman na plena posse das suas capacidades de contador de histórias através da simbiose entre a palavra escrita e a ilustração - e a sua prosa eficaz, evocativa e rica em referências literárias faz-se acompanhar pela arte sólida e consistente de vários ilustradores e coloristas, como Mike Dringenberg, Malcolm Jones III, Chris Bachalo, Steve Parkhouse, Michael Zully, Dave McKean, Sam Kieth e Robbie Busch. Há momentos de grande inspiração, como o sonho de Rose com o censo no Sonho, deliciosamente expandido pelas páginas; ou a Parte 3, intitulada Playing House, no domínio nos sonhos de Jed, com uma ilustração soberba no confronto de Morpheus com um oponente inesperado. Mas mesmo a imagem acaba por ser um pouco secundária; Sandman, para todos os efeitos, continua a ser uma narrativa de carácter profundamente literário, cujos alicerces residem sobretudo na força das palavras de Gaiman e na verosimilhança das suas extraordinárias personagens, numa das histórias mais fascinantes da fantasia moderna. 

* Conclui há dias a leitura de Season of Mists, o quarto volume da colecção (logo falarei dele outro dia, depois de Dream Country). Ainda há, como é bom de ver, um longo caminho a percorrer nesta leitura fascinante, pelo que fica o apelo para que se evitem spoilers em eventuais comentários.

3 de julho de 2014

Slivers, planeswalkers e predadores: As novidades de Magic 2015

Em Maio do ano passado, explorei por aqui a evolução dos Slivers em Magic: the Gathering, desde as suas origens no bloco de Tempest até aos seus regressos em Onslaught, Time Spiral e, por fim, no core set de 2014. Na altura, faltando ainda quase dois meses para o lançamento da expansão, muito se especulava sobre a possibilidade de a (então) nova fornada daquelas criaturas tão populares incluir, à imagem das edições anteriores, um Sliver lord à imagens dos anteriores (Sliver Queen, Sliver Overlord e Sliver Legion): uma criatura com as cinco cores possíveis e com 7/7 de poder e resistência. Não aconteceu: apesar de incluir alguns slivers raros e bastante poderosos, Magic 2014 não incluiu a tão aguardada criatura - uma lacuna que Magic 2015 se propôs preencher ao apresentar o Sliver Hivemaster - e um terreno "tribal" especial, a Sliver Hive. Para além disso, está ainda por apresentar um novo ciclo de slivers incomuns. É uma pena que a ausência destas criaturas em Theros lhes dê um tempo de vida muito curto em Standard, mas estas novas adições decerto farão as delícias dos jogadores mais casuais. E de Commander, claro.

Mas Magic 2015 é bem mais do que o Sliver Hivemaster. Entre os planeswalkers que habitualmente servem de "cabeças de cartaz" (passe a expressão) às colecções básicas, Ajani Goldmane (branco) e Jace Beleren (azul) recebem novas versões - a quinta, em ambos os casos, e em ambos os casos alusiva aos seus mais recentes capítulos na trama de Magic -, Liliana Vess (preto) e Chandra Nalaar (vermelho) são reeditadas em versões anteriores (a original e a versão Pyromaster, respectivamente) e Nissa Revane, apresentada originalmente em Zendikar, ocupa o lugar de Garruk Wildspeaker como representante da cor verde. Garruk, por seu lado, foi promovido a tema central do core set, e é em redor do planeswalker amaldiçoado que se estabelece a narrativa minimalista de Magic 2015 - recebendo por isso uma nova versão multicolorida

Para além disso, há um ciclo de cinco criaturas lendárias (que merece destaque em termos narrativos pelo regresso de Avacyn e de Ob Nixilis e em termos de jogo por Jalira, Master Polymorphist), há algumas reimpressões interessantes, há Goblins de qualidade e há várias cartas criadas por game designers a convite da Wizards of the Coast - e entre os convidados encontram-se Markus "Notch" Persson, criador de Minecraft, Rob Pardo, da Blizzard Entertainment (e, especificamente, de World of Warcraft) e George Fan (Plants vs. Zombies), entre muitos outros. Magic 2015 tem o seu lançamento previsto para o próximo dia 18 de Julho, com as actividades de pré-lançamento a terem lugar no fim-de-semana de 12 e 13. O spoiler completo continua a ser revelado no Mythic Spoiler