31 de março de 2014

Ian McDonald (1960 - )

No que à ficção científica contemporânea diz respeito, poucas vozes se revelam em simultâneo tão originais e tão arrojadas como a de Ian McDonald, escritor inglês radicado na Irlanda no Norte aos cinco anos de idade, e que se estreou como escritor em 1982 com um conto intitulado The Island of the Dead, publicado na Extro, uma revista irlandesa de ficção científica. Esse seria o início da sua carreira enquanto contista; seis anos mais tarde, em 1988, estrear-se-ia como romancista com o extraordinário Desolation Road, um romance futurista que combina um Marte terraformado e em processo de colonização com um realismo mágico mais próximo da literatura sul-americana do que da ficção de género, e com uma prosa notável pela sua fluidez e pelo seu carácter evocativo. 

A ficção científica de Ian McDonald tornou-se distintiva pela forma como transporta as convenções e as ideias do género para cenários pouco explorados ao longo dos anos (mesmo o Marte de Desolation Road e da sua sequela de 2001, Ares Express, é substancialmente diferente do Marte de muita ficção científica - e bem mais bradburyano). A trilogia temática composta pelos aclamados River of Gods (2004), Brasyl (2007) e The Dervish House (2010) será disso o exemplo perfeito, ao desenvolver histórias intricadas em versões futuras da Índia, do Brasil e da Turquia, respectivamente. Tal como a série Chaga (composta pelos romances Chaga e Kirinya, de 1995 e 1997, e o conto Tendeléo's Story, de 2000), situada numa África futura após uma invasão alienígena. A sua vasta bibliografia inclui, entre dezenas de contos, os romances Towards Kilimanjaro (1990), King of Morning, Queen of Day (1991) e Necroville (1994), assim como várias colectâneas de ficção curta (entre as quais merece destaque Cyberabad Days, de 2009, com contos relacionados com River of Gods). 

Actualmente, encontra-se a trabalhar em Everness, uma série de cinco livros de ficção científica (teslapunk, segundo o próprio) para um público young adult, da qual três livros já foram publicados: Planesrunner (2012), Be My Enemy (2013) e Empress of the Sun (2014). E está ainda a desenvolver um díptico de ficção científica intitulado Luna, com uma trama passada numa Lua colonizada. 

Ian McDonald nasceu em Manchester, no Reino Unido, em 1960. Celebra hoje o seu 54º aniversário.

30 de março de 2014

Citação fantástica (119)

Learn from me, if not by my precepts, at least by my example, how dangerous is the acquirement of knowledge, and how much happier that man is who believes his native town to be his world, than he who aspires to become greater than his nature will allow.

Mary Shelley, Frankenstein, or The Modern Prometheus, 1818 

29 de março de 2014

O som e a fúria (19)

Em 1995, o compositor australiano Rod Dougan compôs um tema instrumental com o título Clubbed to Death, que viria a integrar a banda sonora de dois filmes. O primeiro, um filme francês de 1996 relativamente desconhecido, também intitulado Clubbed to Death; o segundo, aquele que será talvez o filme de ficção científica mais importante da minha geração: The Matrix, de Larry e Andy Wachowski. O tema de Dougan surge no momento em que Neo, já libertado da Matriz, entra na simulação urbana de Morpheus onde descobre a natureza ubíqua dos Agentes. Na falta de um videoclip alusivo a The Matrix, aqui fica o vídeo original. 

28 de março de 2014

This happening world (8)

Have Severed Robot Head, Will Travel: com um título humorístico e alusivo a um clássico de Robert A. Heinlein, Ryan Britt expõe no Tor.com cinco possibilidades para a (inevitável) sequela de Prometheus funcionar. São cinco ideias interessantes, ainda que um tanto ou quanto rebuscadas em alguns casos - nenhuma, porém, parece tão boa como imaginar Ridley Scott deixar este projecto de lado e dedicar-se finalmente à adaptação cinematográfica de The Forever War com um grupo de argumentistas com talento. 

Christopher Nolan revelou alguns detalhes sobre o seu próximo filme de ficção científica, Interstellar. O projecto, que conta com Matthew McConaughey como protagonista e que tem por base as teorias científicas de Kip Thorne, continua envolto em mistério, e Nolan não adiantou muitos pormenores; merece destaque, ainda assim, a sua preferência pela construção de cenários sempre que possível, em contraponto à opção cada vez mais fácil (e generalizada) das computer-generated images. Em Novembro, veremos quão realista será o interior da nave. (via io9)

How we won the war on Dungeons & Dragons: Annalee Newitz, do io9, evoca as dificuldades de afirmação do jogo de role-play clássico Dungeons & Dragons, numa época - não tão distante quanto isso - em que, nos Estados Unidos, grupos de pais mais conservadores consideravam o jogo como obra do Diabo. Literalmente. 

Great Unsung Science Fiction Writers That Everybody Should Read: mais um artigo do io9, desta vez pela pena de Charlie Jane Anders. Não me fica muito por dizer: o artigo dá destaque a John Brunner (como se pode ver pela epígrafe, se este blogue tivesse um santo padroeiro, seria Brunner), e nos comentários alguém chamou a atenção para o esquecimento a que tem sido votado a muito subvalorizada obra de Joan D. Vinge. Não o diria melhor.

Fontes: Tor.com / io9

The Fountains of Paradise: Entre a Terra e o Céu

Em 1980, Arthur C. Clarke repetiu o feito do seu romance de 1972, Rendezvous With Rama, ao vencer os prémios Hugo e Nébula na categoria de "Best Novel" com The Fountains of Paradise: um romance conceptual ancorado com firmeza no território da hard science fiction no qual explora a possibilidade de se construir um elevador orbital que, unindo um ponto do equador terrestre a uma estação espacial suspensa em órbita geoestacionária a 36 mil quilómetros de altitude, seja capaz de transportar da superfície do planeta até à órbita baixa passageiros e mercadorias, com apenas uma fracção da energia necessária para tal através de foguetões - uma tecnologia, de resto, notória tanto pela sua ineficiência como pela ausência de alternativas viáveis para sair da superfície terrestre. A proposta, em termos meramente científicos, não é de Clarke - de acordo com o próprio, a viabilidade de construção de um "funicular celestial" é proposta pela primeira vez em 1960 pelo engenheiro soviético Y. N. Artsutanov; Clarke, porém, toma esta possibilidade como ponto de partida e explica, com o rigor que lhe é conhecido, como poderia tal estrutura ser construída, e quão importante seria para a exploração do cosmos e para as relações comerciais de uma Humanidade dispersa por várias colónias no Sistema Solar. 

Em certa medida, The Fountains of Paradise é tanto a história deste projecto megalómano como do seu construtor, Vannevar Morgan,o mais conceituado engenheiro estrutural daquele Século XXII, e um homem que para todos os efeitos já terá assegurado a sua imortalidade através da construção da ponte que atravessa o Estreito de Gibraltar. Em contraponto às personagens que o rodeiam, menos desenvolvidas e colocadas de forma precisa, Morgan surge desenvolvido com alguma profundidade, com motivações reais e dotado de uma humanidade muito sui generis. Talvez não seja de todo descabido afirmar que há qualquer coisa de randiano em Morgan, estabelecendo um certo paralelismo entre o protagonista de The Fountains of Paradise e o de The Fountainhead no seu desejo de superação individual através de desafios puramente técnicos, ao arrepio das opiniões - e, com frequência, das acções - dos seus opositores. Mas Morgan é, acima de tudo, outra figura arquetípica: o engenheiro-tornado-herói de tanta ficção científica de outras décadas (dos anos 80 para cá tem caído em desuso), inabalável na sua convicção científica e desejoso de chegar mais longe - e de levar toda a Humanidade consigo nesse salto evolutivo. 

Mas The Fountains of Paradise é também mais do que Vannevar Morgan ou do que o elevador orbital: é ainda a história de um Sri Lanka alternativo, sempre designado por Taprobana, com a sua história e os seus mitos. É a história - o mito? - da ambição desmedida de um tirano de outros tempos, o rei Kalidasa, que construiu nas alturas de uma das mais altas montanhas da ilha um palácio com o qual pretendia alcançar os céus - e onde, num feito de engenharia notável, foram construídas pelos seus engenheiros as célebres Fontes do Paraíso. É precisamente neste ponto que The Fountains of Paradise se supera: na combinação, extraordinária pela sua harmonia, que tece entre o mito, o passado e o futuro. E fá-lo através da prosa sólida e a espaços poética de Clarke, sempre evocativa nas visões que conjura - da complexidade controlada das "Fontes do Paraíso" ao caos aparente das borboletas proféticas, da sombra da montanha projectada até ao horizonte numa hora muito específica da madrugada às fabulosas auroras boreais. A narrativa encontra-se estruturada em capítulos curtos mas intensos, como é típico na ficção de Clarke - o que dá à leitura um ritmo muito rápido. 

The Fountains of Paradise é considerado por muitos um dos melhores romances de Arthur C. Clarke, e é fácil perceber porquê: a forma como o arrojo conceptual da sua premissa científica surge harmoniosamente combinado com os mitos de Taprobana e o dia-a-dia daquela Humanidade futura é excepcional, e transmite aquele sense of wonder primordial do género, contagiante pela visão que evoca. A previsão de alguns aspectos tecnológicos que se tornaram realidade poucos anos após a sua publicação (os sistemas de informação ao estilo de news feeds são disso um exemplo) será talvez um bónus para os leitores contemporâneos, e um traço de actualidade num romance que, noutros aspectos, denuncia um pouco os seus mais de trinta anos de idade (a caracterização das personagens secundárias será talvez o exemplo mais flagrante - ainda que, como sempre acontece em Clarke, acabe por ser algo mitigado pela sua força conceptual). Mas mais do que isso, é um romance optimista e positivo sobre a superação humana, e a sua capacidade infinita para imaginar, para criar, para chegar mais longe através da sua racionalidade e do seu engenho. E, neste sentido, é um texto notável, e uma peça fundamental no legado que Arthur C. Clarke deixou à ficção científica. 

27 de março de 2014

Joe Haldeman: I looked at the two stories, and I thought, 'I can cross-fertilize these two and get an actual novel out of the situation'" (entrevista)

A propósito do seu mais recente romance, Work Done for Hire, Joe Haldeman foi entrevistado no podcast Geek's Guide to the Galaxy - e a entrevista foi transcrita e publicada online na Lightspeed Magazine. Haldeman, claro, dispensa apresentações - é o autor de The Forever War, um dos mais aclamados romances de ficção cientifica militar. A entrevista, longa e pormenorizada, incide não só sobre o novo romance, mas também sobre a publicação de uma antologia com os seus melhores contos, sobre a sua já longa carreira, e sobre as origens de The Forever War. Alguns excertos:
Geek's Guide to the Galaxy/ Lightspeed Magazine: You had another book that came out recently called The Best of Joe Haldeman, which was edited by Jonathan Strahan and Gary K. Wolfe. Could you talk a bit about how that project came about? 
Joe Haldeman: Basically it’s the best short stories that I’ve written. I’m actually a novelist. I don’t write that many short stories, so I looked at the list of all the short stories I’ve ever published, and I found that their [selections] comprised almost exactly half of the stories, so there is room for another book which is “the worst of Joe Haldeman.” The mirror image of all those wonderful stories. But I haven’t actually proposed it to anybody. 
(...) 
GGG/LM: But this Best of Joe Haldeman, it does include your story “Hero,” which was expanded into a novel, into The Forever War. (...) And I was just amazed by how much detail there is in this story, and how well worked-out everything is regarding the suits, and the environment on Charon and stuff. I was just wondering, did all that just come straight out of your head, or did you research and then go back and rewrite it or anything? 
JH: What I did was: I did research on the fly. Of course, that story was written before computers, and so I basically was going into the library every day and looking up stuff so that I could write about it tomorrow. That was my pattern in those days. I basically wrote my fiction during the morning hours, and in the afternoon I’d go out and do research, and so computers probably save me a certain amount of shoe leather, but I don’t get as much exercise as I did back in the day. 
GGG/LM: Another thing that really struck me about “Hero” is that it doesn’t feature what I think of as being the central conceit of The Forever War, which is the idea that the Earth is different every time the soldiers come back. Had you come up with that idea at that point or did that come later? 
JH: In fact, I came up with the idea before “Hero” came out. I wrote a short story for Amazing Science Fiction ["Timepiece"] which was exactly about that, about people who go out over the course of years, they go out to be soldiers, and they come back and years have passed on Earth when only months have passed in their own lives. That was the basic point and the plot logic of that short story. I looked at the two stories, and I thought, “I can cross-fertilize these two and get an actual novel out of the situation.” Although I don’t remember, there was never an “Ah-ha” moment saying, “Oh my god, I can make million dollars this way.” But it’s obvious if you look at the two stories that the end result is The Forever War.
A entrevista completa pode ser lida na Lightspeed Magazine, ou ouvida no Geek's Guide to the Galaxy.

Jupiter Ascending: Primeiro trailer

Depois do extraordinário e muito independente Cloud Atlas, Lana e Andy Wachowski regressam aos blockbusters de ficção científica com Jupiter Ascending. A premissa, focada numa história de um predestinado (no caso, de uma predestinada, na protagonista interpretada por Mila Kunis) aponta mais para uma space opera mais ancorada no território da science fantasy do que da ficção científica mais "pura" - o que, diga-se de passagem, está longe de ser um problema. Sobretudo se tivermos em conta os visuais espantosos que os Wachowskis têm conjurado desde o revolucionário The Matrix, a possibilidade de ver uma personagem de Sean Bean morrer no espaço, e o pequeno cameo de Terry Gilliam, numa homenagem directa ao clássico Brazil

Apostas à parte, Jupiter Ascending parece ter todos os ingredientes para ser um blockbuster de ficção científica bastante interessante. A estreia está marcada para Julho; abaixo, o trailer. 



Fonte: io9 / IndieWire

George R. R. Martin disponibiliza um novo capítulo de The Winds of Winter

George R. R. Martin disponibilizou online mais um capítulo de The Winds of Winter, o muito aguardado sexto e penúltimo volume da série A Song of Ice and Fire. O título do capítulo, e respectivo ponto de vista, é atribuído a "Mercy" - designação enigmática para uma personagem muito querida pelos fãs, e que se revela ainda mais curiosa uma vez concluída a leitura. É um óptimo capítulo, já agora: muito bem estruturado, e repleto de pormenores capazes de fazer as delícias dos leitores mais atentos - e de, a permanecer inalterado até à publicação do livro, a fornecer pistas muito interessante sobre o rumo de alguns acontecimentos. Enquanto Martin não conclui The Winds of Winter - e entre o receio, cada vez mais palpável, de que a adaptação televisiva alcance os livros antes de o último ser publicado -, fica mais este capítulo como aperitivo. 

"Mercy" pode ser lido no site oficial de George R. R. Martin. Quem quiser acompanhar um debate interessante (e repleto de spoilers) sobre esta passagem, pode fazê-lo aqui.


26 de março de 2014

Edge of Tomorrow: Novo trailer

Ao segundo trailer, Edge of Tomorrow , a adaptação de Doug Liman ao romance All You Need Is Kill, do japonês Hiroshi Sakurazaka, revela-se ainda mais interessante na sua abordagem Groundhog-Day a uma trama de ficção científica militar. Com Tom Cruise e Emily Blunt nos principais papéis, Edge of Tomorrow conta a história de um soldado que se vê capturado num time loop aparentemente infinito no decorrer de uma guerra contra alienígenas. 
Abaixo, o trailer.


Fonte: io9

25 de março de 2014

Perfect Blue: Entre a ilusão e a ficção

Há filmes que, com o passar dos anos, acabam por se tornar irremediavelmente datados, ficando os seus elementos presos no seu tempo concreto, sem possibilidade de fornecer comentários a anos vindouros. Outros há que, pela intemporalidade dos seus conceitos e das suas ideias, resistem à passagem dos anos e são vistos com o mesmo interesse por públicos de várias épocas. E outros há ainda, porventura mais raros, cuja resistência à passagem do tempo reside sobretudo nos seus elementos datados, sem que tal se deva necessariamente a razões nostálgicas (relevantes hoje, e mais do que nunca). Em 1998, o animador japonês Satoshi Kon estreou-se na realização com um destes raros filmes: Perfect Blue, adaptação para longa metragem anime do romance homónimo de Yoshikazu Takeuchi. Será talvez impossível evitar um sorriso quando a protagonista, Mima Kirigoe, começa a aprender a utilizar a Internet e a navegar através do browser Netscape (que ninguém utiliza há mais de uma década); mas há no diário duplicado de Mima uma presciência fascinante para com os adventos da blogosfera (que se daria poucos anos mais tarde) e das redes sociais, com a dissolução da privacidade e a possibilidade do stalking anónimo e recluso; e a sua reflexão perturbada sobre a natureza da celebridade, tão fugaz como ambivalente, acaba por ganhar nova força nestes tempos em que os quinze segundos de fama se aproximaram da literalidade através de uma enigmática qualidade viral.


Perfect Blue é a história de Mima Kirigoe, uma jovem cantora que integra o trio j-pop "Cham!" - cujo sucesso discreto vem acompanhado por um grupo de fãs dedicados. Mima, porém, ambiciona ser mais do que um ídolo pop, pelo que quando surge a oportunidade de se estrear na representação, com um pequeno papel numa thriller policial televisivo, não hesita: abandona a banda para se tornar numa actriz. Um gesto que desagrada a todos - à sua agente, à sua família e aos seus fãs.


A mudança de carreira cedo lhe começa a trazer alguns dissabores - uma mensagem anónima acusa-a de traição, e surge online um blog, aparentemente da sua autoria, que funciona como um diário detalhado e público da sua vida. Nas filmagens, as coisas nem por isso correm melhor: apesar da sua dedicação e da sua vontade de vingar num meio tão difícil, acaba por obter poucas deixas e receber pouca visibilidade. Algo que vai mudar de forma radical quando o argumentista escreve para ela uma cena que promete ser polémica.


Contra os avisos da sua agente de que tal cena arruinará a sua reputação, Mima aceita fazê-la - e verá a sua vida transformada a partir desse momento, quando ao trauma da cena se junta um misterioso e persistente stalker e uma série de homicídios de pessoas que estiveram de alguma forma relacionadas com aquele momento. Aos poucos, Mima vê a realidade a fragmentar-se à sua volta, com a ficção em que participa a misturar-se de forma imperceptível com a sua vida num turbilhão vertiginoso. E, no seu centro, perguntas sem resposta: quem é o stalker? Estará relacionado com os crimes que ocorrem à sua volta? E quem é a misteriosa doppelgänger que vê em toda a parte?


Satoshi Kon recria a paranóia de Mima através de uma montagem a todos os níveis exemplar - a segunda metade do filme é quase na totalidade uma sequência perfeita de set pieces a coalescer na realidade, numa sucessão construída para deixar o espectador na dúvida sobre os limites entre a realidade, ficção e ilusão (sobretudo quando a série televisiva em que Mima participa parece estar a imitar a sua vida - ou será ao contrário?). O ritmo vertiginoso que a narrativa toma ajuda à confusão, e permite a Satoshi Kon criar cenas animadas de qualidade superlativa, icónicas pela sua ambiguidade, quando não pela sua surrealidade.


Enquanto thriller, a comparação entre Perfect Blue e a obra de Alfred Hitchcock é mais ou menos recorrente - para alguém com mais referências na ficção científica do que no cinema do mestre do suspense, será talvez possível encontrar algumas aproximações a Philip K. Dick na fragmentação identitária e na forma como a partir de dada altura a realidade se parece contorcer em redor da protagonista (ainda que o final, retorcido à sua maneira, não seja típico dos registos de PKD). E é também fascinante encontrar aqui um Satoshi Kon em início de carreira, com vários motivos e inúmeras imagens que aperfeiçoaria ao longo dos anos, e que ganhariam uma vida nova e diferente na sua obra-prima de 2006, Paprika.


Independentemente das muitas semelhanças visuais e de algumas aproximações temáticas, Perfect Blue não entra no território da ficção científica como Paprika - é um thriller em estado quase puro, e Satoshi Kon explora com mestria a premissa do romance de Takeuchi com uma animação magnífica, que contribui de forma decisiva para adensar o mistério que está no centro da trama - e, com ele, para aumentar a cada transição o estado de paranóia que se instala a partir da segunda metade do filme. Tenso, violento e complexo tanto na sua estrutura como na abordagem que faz a vários temas ainda relevantes, Perfect Blue é um estudo de personagem fascinante que serviria de influência a vários filmes de culto (Requiem For a Dream e Black Swan, de Darren Aronofski, são os mais óbvios). Em si, é um filme impressionante; como obra de estreia de um realizador, é um feito extraordinário. 8.2/10

Perfect Blue (1997)
Realização de Satoshi Kon
Argumento de Sadayuki Murai a partir do romance homónimo de Yoshikazu Takeuchi
Com Junko Iwao, Rica Matsumoto, Shimpachi Tsuji, Masaaki Ôkura, Yôsuke Akimoto, Emi Shinohara, Hideyuki Hori e Yôsuke Akimoto
81 minutos

X-Men: Days of Future Past: Novo trailer

Foi ontem divulgado um novo trailer para X-Men: Days of Future Past, o novo filme desta franchise da Marvel que adapta o arco narrativo desenvolvido em 1981 por Chris Claremont, John Byrne e Terry Austin. Days of Future Past tem como ponto de partida um futuro distópico no qual os mutantes foram aprisionados em campos de concentração ou simplesmente exterminados pelas Sentinelas - e Kitty Pride transporta a sua consciência para o passado com o propósito de tentar evitar que um acontecimento muito concreto faça eclodir o movimento anti-mutantes. Neste novo filme de Bryan Singer, o destaque não será dado à Kitty Pride de Ellen Page, claro, mas ao Wolverine de Hugh Jackman (aparentemente, a popularidade a isso obriga). Com estreia prevista para Maio próximo, X-Men: Days of Future Past conta com um elenco de luxo, que para além de Page e Jackman inclui também Ian McKellen, Patrick Stewart, Michael Fassbender, Jennifer Lawrence, Peter Dicklage, James McAvoy, Anna Paquin e Halle Berry, entre outros.

Abaixo, o trailer.


Fonte: io9

24 de março de 2014

Kim Stanley Robinson: “All awards are club awards” (entrevista)

Ainda a propósito do aniversário de Kim Stanley Robinson, autor da consagrada "Mars Trilogy" (Red Mars, Blue Mars e Green Mars), de The Years of Salt and Rice e de 2312, aqui fica um destaque de uma entrevista recente que o autor concedeu ao portal húngaro SF Mag. Na entrevista, Robinson fala sobre a importância dos vários prémios de fantasia e ficção científica, sobre a sua carreira literária, sobre alguns progressos científicos contemporâneos e sobre as perspectivas quanto à colonização de Marte, numa alusão à sua célebre trilogia. Um excerto:
SF Mag: Your novel 2312 was posted on several short lists, and won the Nebula Award, too. What’s your take on science fiction awards, how serious do you consider them?
Kim Stanley Robinson: All awards are club awards, this is important to remember. Even the Nobel Prize is just one Swedish club. So I keep that in mind, and what I feel about awards depends on what I feel about clubs; also I know I’m not eligible for many awards, as I am not in the clubs involved, either through my choice or theirs. If it’s their choice I’m not in their club, and I don’t get their award, then that’s their problem, not mine.

So, as a science fiction writer, I think the Hugo award is important, as it comes from the central group of science fiction fans. That’s not exactly my core audience, but I am fond of them, and if they like a book of mine, it means something to me. Then the Locus awards, given out by Locus magazine, used to be a readers’ poll, and the readers of Locus are the industry itself: writers, editors, publishers, booksellers, people who really care. So a Locus Award was a big thing to me, coming from the industry. Now they have opened the award to anyone who wants to vote, which reduces its meaning for me greatly. In fact I am pleased that they report that if the poll was restricted to Locus subscribers only, both Galileo’s Dream and 2312 would have won the Locus awards in the year they came out. I remember that even though it is not official, because it’s a sign from the industry I am part of. Then the Nebula award comes from my fellow sf writers, and that matters of course, but writers all have their own agendas, and it’s the young sf and fantasy writers who care most about that one, so they vote for their friends, and it’s very clubby.

The British SF Awards come from British fans and I love the British sf community, so that one matters to me. The various jury awards (Clarke, Tiptree, Pulitzer, any jury award) are simply jury awards and the juries have to reconcile their votes and it’s a mess; I’ve been on juries and seen it. So no jury award means much to me, though if a book of mine were to get one, I would be pleased of course. But it would mean precisely that 7 people compromised by picking my book. So in fact, real sales matter hugely more, as being choices by that many more readers. What counts are readers. Giving a book the time to read it; the effort; that’s a big gift!
A entrevista completa pode ser lida em inglês no SF Mag.

Fontes: SF Mag / SF Signal

23 de março de 2014

Kim Stanley Robinson (1952 - )

A ficção científica contemporânea tem em Kim Stanley Robinson uma das suas vozes mais conceituadas e premiadas. Com uma carreira iniciada ainda nos anos 70 com a publicação de ficção curta, publicou em 1984 os seus primeiros romances: Icehenge e The Wild Shore, este último a constituir a primeira parte da trilogia “Three Californias”, da qual fazem ainda parte The Gold Coast (1988) e Pacific Edge (1990). Mas a sua consagração deu-se já em 1990 com a publicação de uma outra trilogia, a célebre “Mars Trilogy”, uma obra de longo alcance na qual imaginou um Marte futuro, terraformado e colonizado pela Humanidade. Red Mars, de 1993, aborda a colonização humana do Planeta Vermelho: Green Mars, de 1994, explora o tema da terraformação; e Blue Mars, de 1996, mostra as implicações a longo prazo dos temas dos dois livros anteriores. Neste universo ficcional, Robinson publicou ainda vários contos, compilados em 1999 no volume intitulado The Martians

A sua longa bibliografia inclui ainda a trilogia "Science in the Capital", constituída por Forty Signs of Rain (2004), Fifty Degrees Below (2005) e Sixty Days and Counting (2007); e títulos como The Memory of Whiteness (1985), Antartica (1997), The Years of Rice and Salt (2002), Galileo’s Dream (2009) e 2312 (2012). O seu mais recente romance, Shaman: A novel of the Ice Age, foi publicado no ano passado. A sua ficção curta encontra-se publicada em várias antologias, como The Planet on the Table, de 1986, Escape from Kathmandu, de 1989 e Vinland the Dream, de 2001, entre outras. Entre os temas mais recorrentes da ficção de Kim Stanley Robinson encontramos a ecologia e a sustentabilidade, assim como a justiça económica e social

Com um total de 29 nomeações para os principais prémios da ficção científica e fantasia, Robinson venceu 13. Nas categorias de “Best Novel”, os três romances que compõem a “Mars Trilogy” conquistaram seis distinções: Red Mars venceu o prémio Nébula e o British Science Fiction Award, e Green Mars e Blue Mars conquistaram ambos o Hugo e o Locus. O seu romance de estreia, The Wild Shore, venceu o Prémio Locus na categoria de “Best First Novel”; Pacific Edge foi agraciado com o Prémio John W. Campbell , e The Years of Rice and Salt e o recente 2312 valeram a Robinson o Locus e o Nébula nas categorias principais, respectivamente. No que à ficção curta diz respeito, a novela Black Air foi distinguida com o World Fantasy Award, e A Short, Sharp Shock venceu o Nébula. A colectânea The Martians foi ainda distinguida com o Locus na categoria de “Best Collection”.

Robinson trabalhou ainda a ficção científica na sua carreira académica: a sua tese de doutoramento, publicada em 1984, intitula-se The Novels of Philip K. Dick, e incidiu sobre a obra daquele que terá sido um dos mais influentes autores que o género conheceu.

Kim Stanley Robinson nasceu em Waukegan, no estado do Illinois, em 1952, e celebra hoje o seu 62º aniversário.

Citação fantástica (118)

Over the years Rajasinghe - himself the bearer of a royal name, and doubtless host to many regal genes - had often thought of those words; they demonstrated so perfectly the ephemeral nature of power, and the futility of ambition. "I am the King." Ah, but which King? The monarch who had stood on these granite flagstones - scarcely worn them, eighteen hundred years ago - was probably an able and intelligent man; but he failed to conceive that the time could ever come when he would fade into an anonymity as deep as that of his humblest servants. 


Arthur C. Clarke, The Fountains of Paradise (1979)

22 de março de 2014

O som e a fúria (18)

Hoje regressamos aos britânicos Muse - e a um tema do seu álbum de 2006, Black Holes and Revelations, que se tornaria numa espantosa música de encerramento daquela tour (que passou por Lisboa, num concerto memorável no Campo Pequeno) e numa peça imprescindível dos seus concertos desde então. Falo de Knights of Cydonia, evidentemente - que merece aqui destaque pelo videoclip realizado por Joseph Kahn, com uma micronarrativa western spaghetti de ficção científica pós-apocalíptica num Marte terraformado, com kung-fu cowboys, amazonas montadas em unicórnios, robots e ray guns. Sim - é tão over the top como aparenta; e é precisamente por isso que é uma pequena maravilha.


21 de março de 2014

Do Androids Dream of Electric Sheep?: Empatia artificial

Quem tiver visto Blade Runner, o filme de 1982 realizado por Ridley Scott que adaptou para o grande ecrã o romance Do Androids Dream of Electric Sheep?, decerto estará recordado do momentos iniciais, com a visão panorâmica de uma Los Angeles futurista cuja escuridão é cortada com violência pelas explosões das chaminés - tudo isto ao som da magnífica banda sonora de Vangelis. A adaptação de Scott ao romance de Philip K. Dick é, para todos os efeitos, bastante livre (passe o eufemismo); quaisquer duvidas sobre esse ponto cedo serão dissipadas com a leitura do primeiro capítulo de Do Androids Dream of Electric Sheep? (1982): Longe da visão majestosa de uma Los Angeles sombria e devastada pela guerra e pelo fallout, o romance clássico de Dick abre com algo tão banal como uma discussão conjugal entre o protagonista, Rick Deckard, e a sua mulher, Iran. 

A cidade, note-se, continua presente - e as descrições de Dick são quase tão evocativas como as imagens de Scott, conjurando na perfeição a Los Angeles devastada de um futuro próximo após a derradeira Guerra Mundial - um futuro no qual os boletins meteorológicos incluem previsões de fallout e no qual a malha urbana, outrora sobrepovoada, cede cada vez mais espaço ao vazio, à ausência de habitantes, desaparecidos na voragem da guerra ou - no caso daqueles que têm tal possibilidade - emigrados para as colónias extra-terrestres. Deckard, porém, não desapareceu ou emigrou, e continua a desempenhar a sua função de bounty hunter para as autoridades locais, caçando e eliminando quaisquer andróides que tentem regressar à Terra. E, na impossibilidade de ter um animal de estimação vivo - a guerra extinguiu a maioria da fauna terrestre -, mantém uma ovelha eléctrica, simulacro perfeito do animal real, no seu terraço.

A importância da ovelha eléctrica não é de somenos, e funciona como metáfora perfeita do grande tema de Do Androids Dream of Electric Sheep?: a empatia enquanto atributo intrinsecamente humano. O primeiro capítulo, com a discussão conjugal em torno do Penfield mood organ, um aparelho para induzir estados emocionais pré-configurados nos seus utilizadores (do optimismo para com as possibilidades da vida ao entusiasmo para com o trabalho diário - até aos estados de depressão e despero que Iran aprende a manipular com a mesma atitude passivo-agressiva que encara a relação com Deckard), introduz esta ideia de forma cristalina. Deckard e Iran, como quase todos aqueles que permanecem na Terra, vivem em isolamento e em desagregação, alimentados pelas emoções artificiais dos mood organs, pelos sentimentos de pertença artificiais da religião de Wilbur Mercer ou do niilismo por via da comédia do programa televisivo "Buster Friendly and His Friendly Friends". Um animal vivo, luxo derradeiro numa época na qual a fauna terrestre se encontra praticamente extinta, representa mais do que um símbolo de estatuto social: representa uma criatura com a qual criar laços. Na ausência do animal real, que cobiça, Deckard procura recriar esses laços na sua ovelha mecânica, simulacro tão perfeito como artificial do animal que representa. E é aqui que entram os andróides Nexus-6, na aparência e na inteligência indistinguíveis dos seres humanos, que Deckard caça por profissão. 

É por este prirsma - na destruição do artificial para obter algo real, enquanto mantém a empatia com o artificial - que Philip K. Dick problematiza a empatia e, em última análise, aquilo que define um ser humano. Outros motivos recorrentes na sua obra surgem também em Do Androids Dream of Electric Sheep?, como a dúvida perante a irrealidade do real ou a fragmentação identitária - ambos, porém, surgem como temas auxiliares na exploração filosófica do que significa ser humano - e se tal conceito estará restrito aos humanos de carne e osso, ou se será extensível aos simulacros que a Humanidade concebeu. Que Philip K. Dick tenha conseguido desenvolver este tema de forma tão cativante numa trama intensa, quase noir, oscilando entre os momentos de acção bem ritmados e passagens introspectivas fascinantes atesta em definitivo os seus atributos enquanto ficcionista e a sua capacidade abordar em termos filosóficos temas que outros autores apenas aflorariam com brevidade (convenhamos: uma história simples sobre um caçador de andróides ilegais já seria, em si, bastante apelativa). Do Androids Dream of Electric Sheep? é um clássico incontestável da ficção científica, e um exemplo perfeito da sua obra: complexo, filosófico e multifacetado. 

20 de março de 2014

The Signal: Primeiro trailer

Foi ontem divulgado o primeiro (e muito promissor) trailer de The Signal, um filme de ficção científica que estreou na última edição do festival de Sundance. Realizado por William Eubank e com Laurence Fishburne num dos principais papéis, The Signal acompanha três estudantes que, numa viagem pelo Nevada em busca de um hacker rival, acabam por encontrar algo muito maior do que o esperado. 

The Signal tem estreia prevista para Junho próximo nos Estados Unidos. Abaixo, o trailer:


Fonte: io9

This happening world (7)

No Tor.com, um artigo interessantíssimo de Grady Hendrix sobre aquele que terá talvez sido o maior filme de ficção científica nunca realizado, e cuja história - cujo mito - regressou recentemente à ribalta a propósito de um documentário de Frank Pavich. Falo da adaptação do clássico de Frank Herbert, Dune, pelo chileno Alejandro Jodorowsky. Hendrix traça um resumo fascinante sobre a atribulada odisseia que foi a pré-produção milionária deste filme, na qual participaram algumas personalidades que se viriam a revelar extremamente influentes na ficção científica dos anos que se seguiriam, como Dan O'Bannon, H. R. Giger e Moebius. Para o bem ou para o mal, o filme nunca passaria da fatídica pré-produção; e seria David Lynch quem acabaria por, em 1984, transportar a história - ou parte dela - de Frank Herbert para o grande ecrã. 

Christopher Tolkien continua a dar a conhecer alguns dos trabalhos que o seu pai deixou por publicar - e em Maio próximo será editado pela Harper & Collins a tradução de Tolkien de Beowulf, o poema anglo-saxónico clássico do século XI. Intitulada Beowulf: A Translation and a Commentary, esta edição inclui a tradução de Tolkien, que já conta 90 anos, várias palestras que Tolkien deu na Universidade de Oxford sobre o poema (que ele mesmo resgatou da semi-obscuridade) e o conto original Sellic Spell

Disney prepara sequela a The Incredibles. A esta altura do campeonato, a Disney apenas surpreende pela demora: com dois Óscares da Academia e um box office global de mais de 600 milhões de dólares, o filme escrito e realizado por Brad Bird em 2004 foi um sucesso tanto crítico como comercial. Aparentemente, o preço a pagar será... mais uma sequela a Cars

A quarta temporada de Game of Thrones tem mais um trailer. A estreia portuguesa, essa, está prevista para 8 de Abril.



Fontes: Tor.com / The Guardian / io9

19 de março de 2014

Arthur C. Clarke Awards 2014: Os finalistas

Foram ontem reveladas as obras finalistas da edição de 2014 dos Prémios Arthur C. Clarke, uma das mais prestigiadas distinções atribuídas no Reino Unido à ficção científica literária. Criado em 1987, este prémio já distinguiu autores como Margaret Atwood, Pat Cadigan, Bruce Sterling, Gwyneth Jones e Richard K. Morgan, entre outros. Nesta edição de 2014 - relativa a livros publicados durante o último ano -, a shortlist inclui três romances de estreia. O vencedor será conhecido no próximo dia 1 de Maio, na Royal Society.

A shortlist para os Prémios Arthur C. Clarke 2014 é a seguinte:
  • The Adjacent, de Christopher Priest (Gollancz)
  • Ancillary Justice, de Ann Leckie (Orbit)
  • The Disestablishment of Paradise, de Phillip Mann (Gollancz)
  • God's War, de Kameron Hurley (Del Rey)
  • The Machine, de James Smythe (Blue Door)
  • Nexus, de Ramez Naam (Angry Robot)

18 de março de 2014

Total Recall: A persistência da memória

Nos onze anos decorridos entre 1987 e 1997, o realizador holandês Paul Verhoeven realizou três filmes de ficção científica que, não alcançando o estatuto de obras-primas de algumas obras do género suas contemporâneas, acabaram por se tornar em clássicos de culto da ficção científica cinematográfica e em entradas maiores na sua filmografia pessoal (a par, claro, do inevitável Basic Instinct). São, como é bom de ver, três filmes bastante diferentes nos temas abordados, nas narrativas exploradas, e mesmo nas suas origens (um é original, dois são adaptações de clássicos da ficção científica literária). Há entre eles, porém, uma certa homogeneidade na estética e no tom; e essa homogeneidade acaba por aproximá-los, dando forma a uma trilogia tão singular como relevante na ficção científica dos anos 80 e 90. O primeiro filme desta tríade foi Robocop, obra original de Verhoeven da qual aqui falarei em breve (ou assim espero); o último foi Starship Troopers, adaptado de forma muito livre (passe o eufemismo) do romance clássico de Robert A. Heinlein. E entre os dois, no ano de 1990, estreou Total Recall, levantado do conto We Can Remember It for You Wholesale que Philip K. Dick publicou em 1966 nas páginas da revista The Magazine of Fantasy & Science Fiction

Logo numa das primeiras cenas de Total Recall é possível encontrar um pouco do tom cínico, quase satírico, que viria a marcar Starship Troopers: quando o protagonista, Douglas Quaid (interpretado por Arnold Schwarzenegger) vê no noticiário matinal uma pela sobre a rebelião de mutantes num Marte explorado pela mega-corporação mineira de Vilos Cohaagen (Ronny Cox). A rebelião é prontamente esmagada pelas forças paramilitares de Cohaagen - with minimal use of force, ouve-se a jornalista dizer, entre o som de fogo real. 


Verhoeven, porém, revela uma maior compreensão das idiossincrasias da obra de Philip K. Dick do que outros realizadores que arriscaram adaptações da obra do autor norte-americano (como John Woo). O tom mais próximo da sátira mediática que marcaria o seu filme de 1997 está presente em Total Recall, mas em terceiro ou quarto plano; serve para dar alguma cor ao cenário e para fazer uma introdução inteligente a um plot point que será relevante mais à frente na narrativa - e nada mais. Debaixo da sua violência algo gráfica e da estética marcadamente verhoeveniana, encontramos em Total Recall um filme que explora com competência e sensibilidade as noções de fragmentação de identidade e de realidade, por via da manipulação de memórias e de papéis, que são tão caras a Philip K. Dick.


Total Recall transporta o espectador para Marte logo na primeira cena: um sonho do protagonista passado na superfície de Marte, acompanhado por uma mulher que não conhece - e que cedo se torna evidente não ser a sua mulher, Lori (Sharon Stone). Os sonhos de Marte atormentam Quaid há já alguns anos - quando, na verdade, nunca esteve no Planeta Vermelho. Para tentar lidar com a situação, acaba por recorrer à proposta de um anúncio de uma corporação, a Rekall Incorporated: a possibilidade de ter as memórias completas de umas férias de sonho em Marte, ao invés de empreender a viagem. E com um bónus: poderá visitar Marte na qualidade de agente secreto, numa ficção tornada realidade pela construção de memórias a pedido.


O processo de implantação das memórias, porém, corre mal, e Quaid vê-se envolvido numa conspiração que lhe demonstra toda a sua vida ser falsa, incluindo a sua mulher. Essa conspiração estende-se até Marte, e até ao próprio Cohaagen, e Quaid acaba por partir para Marte em busca não só da sua identidade, mas também de algo que explique a situação em que se encontra - mas quando a realidade que está a viver se começa a assemelhar de forma estranha ao sonho prometido pela Rekall, como distinguir a realidade da ficção?


Verhoeven joga bem com a dúvida constante - o argumento revela-se astuto, construído em redor de reviravoltas bem montadas a explorar as memórias verdadeiras e falsas (e o final consegue resolver todo o enredo sem fornecer uma resposta definitiva, bem ao estilo de Philip K. Dick). A chegada a Marte adensa a trama, colocando em jogo o movimento rebelde de Kuato (aludido no spot informativo inicial) e o próprio Coohagen - até ali, o rosto do vilão foi o seu principal capanga, Richter (numa excelente interpretação de Michael Ironside).


Mas onde Total Recall se transcende é na sua elaborada construção visual, que enriqueceu o enredo sólido com uma estética singular, tipicamente verhoeveniana na sua opção por efeitos práticos imaginativos e uma caracterização soberba. O resultado é sempre imaginativo e, a espaços, icónico. Imagens como o célebre scanner de armas com raio-X, o "Johnny-Cab", os mutantes grotescos e tão humanos de "Venusville" (qual red light district marciano), a prostituta com três seios, o disfarce a desmontar-se e as descompressões violentas na exposição à atmosfera de Marte persistem na cultura popular e deram um contributo inestimável para o (justíssimo) estatuto de culto que o filme alcançou.


Sendo um filme já dos anos 90, Total Recall ainda transporta alguma bagagem temática da década que o antecedeu - o destaque dado à opressão corporativa é disso exemplo. Os elementos tradicionais de Verhoeven estão lá todos - o princípio de sátira, as deixas algo camp, mas o filme ascende acima desses detalhes para explorar, numa fascinante construção visual que em momento algum abdica de um argumento sólido, uma trama típica de Philip K. Dick. É certo que Verhoeven poderá talvez ter tornado o filme mais violento do que o necessário (as histórias de Dick raramente o são, pelo menos em termos físicos), mas isso não retira mérito à qualidade da sua adaptação. 08/10

Total Recall (1990)
Realização de Paul Verhoeven
Argumento de Dan O'Bannon, Ronald Shusett, Jon Povill e Gary Goldman a partir do conto We Can Remember It for You Wholesale, de Philip K. Dick
Com Arnold Schwarzenegger, Rachel Ticotin, Sharon Stone, Michael Ironside, Ronny Cox, Marshall Bell e Mel Johnson, Jr.
113 minutos

17 de março de 2014

Tolkien - Construtor de Mundos: Segunda edição

A segunda edição do seminário "Tolkien - Construtor de Mundos", organizado pelo Centro de História (CH/UL) e pelo Centro de Estudos Anglísticos (CEAUL) da Universidade de Lisboa, terá lugar no próximo dia 27 de Março na na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (Anfiteatro III). Para além da sessão de abertura, o seminário contará com dez sessões agendadas entre as 09:30 e as 17:00, nas quais serão debatidos vários aspectos da obra de Tolkien, com predominância para temáticas relacionadas com a sua Terra Média (apenas uma das sessões parece sair daquele mundo secundário). O programa completo pode ser consultado na página do CEAUL.

Fonte: CEAUL

16 de março de 2014

Citação fantástica (111)

A managed democracy is a wonderful thing... for the managers... and its greatest strength is a 'free press' when 'free' is defined as 'responsible' and the managers define what is 'irresponsible'.

Robert A. Heinlein, The Moon Is a Harsh Mistress (1966)

15 de março de 2014

O som e a fúria (17)

Até ao início da semana que agora termina não tinha ouvido falar dos The Telekinetics, uma banda pop de Los Angeles mais ou menos desconhecida por estas paragens até o SF Signal - e vários outros portais dedicados ao fantástico - darem destaque a Science Fiction, um dos temas do EP homónimo da banda. E esse destaque não se deveu tanto ao título e à letra da música como ao videoclip que a acompanha, uma excelente montagem de vários momentos de alguns clássicos da ficção científica cinematográfica dos anos 50 e 60, como Forbidden Planet ou The Day the Earth Stood Still (e outros - deixo o convite a quem quiser alinhar todas as referências). Em suma: quatro minutos e 12 segundos de nostalgia. Aqui fica, como tema da semana, Science Fiction.


Fonte: SF Signal

14 de março de 2014

River of Gods: Fragmentos de uma Índia futura

Vários têm sido os autores de ficção científica que, ao longo dos últimos anos, se têm esforçado para trazer ao género uma diversidade cultural que este não experimentou durante o seu apogeu - numa tentativa de superação do paradigma caucasiano, ocidental e anglo-saxónico que deu, e dá ainda, forma a uma fracção muito significativa do que se publica todos os anos no género. Poucos, porém, terão feito dessa premissa uma carreira tão bem sucedida como Ian McDonald, um inglês radicado na Irlanda (atente-se na ironia do exercício), que desde a publicação do seu primeiro romance em 1988, Desolation Road, tem trazido um exotismo muito próprio para os lugares tradicionais da ficção científica, ou transportado as premissas e os temas típicos do género para locais e culturas onde estes poucas vezes foram explorados. Em 2004, transportou para uma Índia futura e fragmentada o tema da Inteligência Artificial e em algumas ideias próximas do cyberpunk, e o resultado foi o romance vencedor na categoria de "Best Novel" dos British Science Fiction Awards desse ano: River of Gods.

Em certa medida, o que McDonald faz em River of Gods é um pouco o que John Brunner fez em Stand on Zanzibar (de resto, uma influência declarada do autor para esta obra): desenvolve uma premissa multifacetada e explora a partir dela toda uma visão transversal de uma sociedade ao mesmo tempo familiar e futurista, fazendo convergir para o centro da narrativa um conjunto de personagens com origens, personalidades e ambições radicalmente distintas - e profundamente verosímeis na sua plena individualidade. No caso, a sociedade presente e futura onde se situa a acção (ou a maioria da acção) é a Índia de 2047, um século volvido após o seu centenário enquanto nação independente. Que não se pense, porém, que este cenário serve apenas de pano de fundo a uma história de ficção científica mais "convencional", que poderia talvez ser contada com outro enquadramento; com a sua prosa sofisticada e evocativa, rica nas descrições e desafiante na mistura quase musical que faz de expressões hindi no seu inglês elaborado, a Índia de McDonald assume quase o estatuto de protagonista: oscilando entre o seu conservadorismo social e a sua sofisticação tecnológica, fragmentada num sem-número de estados que mantém entre si relações tensas, à beira de entrarem em guerra pela água que escasseia após alguns anos sem monção. 

Toda esta realidade política e social é central à narrativa; e é para ela que vai convergir um elenco tão díspar como curioso. Temos Shiv e o seu sidekick Yogendra, dois pequenos criminosos que se irão envolver numa conspiração mais profunda do que imaginaram possível; Mr. Nandha, o Krishna Cop, um autêntico Rick Deckard moderno que caça Inteligências Artificiais (aeais, como McDonald as designa) ilegais e as desfaz com projécteis EMP; a sua mulher, Parvati, oriunda da Índia rural e perdida no meio da vasta e antiga Varanasi; Vishram Ray, o terceiro filho de um magnata da indústria energética, que se vê obrigado a abandonar a sua carreira de comediante na Europa por uma questão familiar inesperada; Tal, um nute (indivíduo que se submeteu a intervenções de uma complexidade inimaginável para abdicar da sua identidade sexual) que trabalha na produção de Town & Country, uma novela virtual interpretada por Inteligências Artificiais que são em simultâneo actores e celebridades (e o exemplo perfeito da mestria de McDonald de tornar o estranho plausível e humano); Shaheen Badoor Khan, muçulmano e o cérebro por detrás do governo de Sajida Rana; Najia Askarzadah, uma jornalista sueca de origem afegã que dá por si no meio do furo jornalístico da década; Lisa Durnau, uma física norte-americana que irá encontrar num asteróide próximo da Terra algo extraordinário e impossível; Thomas Lull, um dos mais reputados académicos mundiais na área da Inteligência Artificial, em exílio auto-imposto na Índia; e Ajmer Rao, uma jovem rapariga com a capacidade desconcertante de comunicar com os deuses, numa cruzada pessoal para descobrir os seus pais biológicos.

Ao longo das várias histórias é possível encontrar registos muito distintos entre si - e McDonald manipula-os com a mesma destreza com que mantém sob controlo as várias narrativas individuais, quais tributários de um rio que irão convergir no curso principal no local mais apropriado. A algumas cenas de acção intensa, quase cinematográfica no seu ritmo frenético, juntam-se momentos dignos de um filme cyberpunk - como a excomunhão de uma aeai que Mr. Nandha leva a cabo, ajudado pelos seus avatares virtuais com a forma e os atributos das divindades hindu. O mistério, esse, é revelado com rigor e mestria - e lido o clímax, há uma vontade súbita, quase irresistível, de fazer uma releitura que revele vários indícios e inúmeras pistas deixadas ao longo do texto.

Denso, volumoso e fragmentado por quase uma dezena de enredos paralelos assentes em personagens tão distintas como individualizadas e situado numa Índia futura descrita e extrapolada com um nível de detalhe a todos os níveis impressionante, River of Gods revela-se um livro exigente para o leitor: pede-lhe tempo, requer disponibilidade, obriga à reflexão sobre a sociedade que mostra (com todas as suas idiossincrasias e contradições) e sobre os conceitos que apresenta, quase sempre de forma muito pouco convencional. Mas o momento em que as várias tramas dispersas, quais fios soltos de uma vasta tapeçaria, começam a convergir para o centro da acção na cidade em simultâneo antiga e moderna de Varanasi, nas margens do Ganges, River of Gods recompensa em larga medida a persistência do leitor para se revelar num trabalho a todos os níveis excepcional, elevado pela riqueza da sua prosa, pela complexidade do seu enredo e pelas questões que a premissa, e a forma como esta é abordada, suscita. Se em 2004 Ian McDonald ainda precisasse de confirmar o seu estatuto de uma das vozes mais irreverentes e talentosas da ficção científica contemporânea, River of Gods seria a sua confirmação definitiva: sem dúvida, um dos grandes trabalhos que o género conheceu neste novo milénio.

13 de março de 2014

Rogues: Nova antologia de George R. R. Martin e Gardner Dozois

Depois de Songs of the Dying Earth (2009), Warriors (2010), Old Mars (2013) e Dangerous Women (2013), George R. R. Martin e Gardner Dozois voltam a juntar-se para a edição de uma nova antologia de ficção curta. Intitulada Rogues, esta colectânea terá como tema, nas palavras do próprio Martin no anúncio feito no seu bloguerogues, cads, scalawags, con men, thieves, and scoundrels of all descriptions - e entre os seus contos estarão trabalhos de ficção científica, ficção histórica, fantasia épica, sword and sorcery, comédias, tragédias policiais e obras mainstream. Para além das duas dezenas de histórias seleccionadas de autores conceituados, George R. R. Martin irá também publicar nesta antologia uma nova história do seu mundo ficcional de A Song of Ice and Fire. Com o título The Rogue Prince, or, the King's Brother, esta história antecederá na cronologia de Westeros os eventos narrados em The Princess and the Queen, a novela publicada no ano passado em Dangerous Women.

A lista completa de autores que integrará Rogues, com os respectivos trabalhos, será a seguinte:

George R. R. Martin, Everybody Loves a Rogue (Introdução)
Joe Abercrombie, Tough Times All Over
Gillian Flynn, What Do You Do?
Matthew Hughes, The Inn of the Seven Blessings
Joe R. Lansdale, Bent Twig
Michael Swanwick, Tawny Petticoats
David Ball, Provenance
Carrie Vaughn, The Roaring Twenties
Scott Lynch, A Year and a Day in Old Theradane
Bradley Denton, Bad Brass
Cherie Priest, Heavy Metal
Daniel Abraham, The Meaning of Love
Paul Cornell, A Better Way to Die
Steven Saylor, Ill Seen in Tyre
Garth Nix, A Cargo of Ivories
Walter Jon Williams, Diamonds From Tequilla
Phyllis Eisenstein, The Caravan to Nowhere
Lisa Tuttle, The Curious Affair of the Dead Wives
Neil Gaiman, How the Marquis Got His Coat Back* 
Connie Willis, Now Showing
Patrick Rothfuss, The Lightning Tree
George R. R. Martin, The Rogue Prince, or, the King's Brother

Rogues será editada pela Bantam Spectra e tem data de publicação prevista para 17 de Junho de 2014. 

Fonte: Not a Blog

* Novela situada no universo ficcional de Neverwhere

This happening world (6)

No Polygon, um portal dedicado aos videojogos, um dos melhores artigos de cinema que li em muitos anos: Street Fighter: The Movie - What Went Wrong. Chris Plante assina esta reportagem sobre a produção, no início dos hoje longínquos anos 90, da primeira adaptação cinematográfica daquele que era, e é ainda, um dos mais populares beat'em ups da história dos videojogos. Da inexperiência do realizador, Stephen de Souza, à ingerência corporativa da Capcom; dos problemas com o guião, tão diversos como o vício de Jean-Claude Van Damme em drogas duras ao cancro de que padecia Raúl Juliá (Street Fighter foi mesmo o último filme do actor); dos problemas nos estúdios tailandeses ao descalabro de calendarização e de orçamento - nada é deixado de fora nesta magnífica peça. Quem já tenha visto o filme (e será difícil não ter nele tropeçado a dada altura nos últimos 20 anos) decerto saberá quão mau ele é; o artigo de Plante explica como tal foi possível. Fica como leitura mais do que recomendada

CD Projekt RED adia o lançamento de The Witcher 3: Wild Hunt para Fevereiro de 2015. O anúncio, avançado por Nathan Grayson no Rock, Paper, Shotgun, foi feito pelos responsáveis do estúdio polaco numa carta aberta publicada no portal de The Witcher
We recently reexamined what we had achieved thus far, and faced a choice about the game’s final release date. The decision we made was difficult, thoroughly considered, and ultimately clear and obvious. We could have released the game towards the end of this year as we had initially planned. Yet we concluded that a few additional months will let us achieve the quality that will satisfy us, the quality gamers expect from us. Consequently, we have set the release of The Witcher 3: Wild Hunt for February 2015.
Dito de outra forma: será lançado quando estiver pronto, uma máxima que tem vindo a perder força numa indústria cada vez mais constrangida por resultados trimestrais e por lançamentos apressados de jogos mais ou menos inacabados. À primeira vista, esta é uma excelente decisão da CDPR; em Fevereiro do próximo ano, quando a nova (porventura última?) aventura interactiva de Geralt of Rivia estiver disponível, veremos se terá sido justificada. 

No Tor.com, Ryan Britt lança a discussão e a polémica: na filmografia de Alfonso Cuarón, será Harry Potter and the Prisoner of Azkaban um filme melhor que o recente e aclamadíssimo Gravity? O exercício tenta comparar algo quase incomparável, pelo que talvez a coisa possa ser arrumada de outra forma: dos oito filmes da série Harry Potter, The Prisoner of Azkaban será sem dúvida um dos melhores, se não mesmo o melhor; Gravity, sendo sem dúvida um filme extraordinário, será porventura o seu grande feito em termos técnicos; e entre ambos, como não podia deixar de ser, encontramos Children of Men - um filme tecnicamente irrepreensível com uma história formidável, que será talvez o seu melhor trabalho. 


12 de março de 2014

Space Noir: Primeiro trailer

O regresso dos videojogos ao espaço continua a ser feito a bom ritmo neste ano de 2014: depois de Star Citizen, Elite: Dangerous e No Man's Sky (e porventura mais alguns títulos a curto e médio prazo), Space Noir - um space sim desenvolvido pela N-Fusion com mais space do que noir, e com uma proposta single-player dividida em 35 missões em cinco mundos diferentes. Abaixo, o primeiro trailer. 

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11 de março de 2014

Gateway, de Frederik Pohl, será adaptado para televisão

A confirmar-se, esta poderá ser uma das grandes notícias da ficção científica em 2014: Gateway, o romance clássico de Frederik Pohl que conquistou os prémios Hugo, Nebula, Locus e John W. Campbell Memorial na categoria de "Best Novel" entre 1977 e 1978, será adaptado para uma série televisiva. De acordo com o io9 (via Deadline), os direitos de adaptação foram adquiridos pela Entertainment One Television (The Walking Dead) e pela De Laurentiis Co. (Hannibal); e, de momento, as produtoras estarão a seleccionar os argumentistas que transportarão esta fascinante história de Pohl para o pequeno ecrã.

Publicado originalmente em várias partes na revista Galaxy, Gateway situa-se num futuro distópico com uma Terra sobrepovoada, na qual muita gente trabalha em condições miseráveis para poupar o suficiente para comprar um bilhete de ida para "Gateway": uma estação espacial alienígena construída num asteróide próximo do nosso planeta, e repleta de naves interestelares aparentemente funcionais. Quem vai tentar a sorte em "Gateway" torna-se prospector: embarca numa das naves para o seu destino pré-configurado (e inalterável), e parte rumo ao desconhecido. Apenas um terço das naves regressa; nem todas as tripulações, porém, o fazem com vida. A história centra-se em Robinette "Bob" Broadhead, um prospector que fez fortuna numa expedição e que, no presente narrativo, vive entre a elite nova-iorquina. Para além da fortuna, porém, trouxe também um trauma profundo; e é ao longo das suas sessões psiquiátricas que a verdadeira história da sua estadia no asteróide e da expedição em que participou emerge, de forma tão espantosa como aterradora. 

Que Gateway tem muito potencial para dar origem a um excelente drama de ficção científica, disso não há dúvida. Resta saber como será adaptado. 

Fontes: io9 / Deadline